“LOGAN LUCKY” – Um assalto na superfície da comédia
A comédia pode encantar tanto pela leveza do entretenimento quanto pelas críticas sociais propostas. Desde suas primeiras manifestações nas artes cênicas, satiriza os comportamentos humanos, expondo contradições e exageros. Muitas vezes, aproveitando o engajamento do público, mostra problemas sociais importantes em seus subtextos. Verdade que esse não é um dever do gênero comédia, mas pode ser um bom uso da atenção que conquista de forma despretensiosa. Em LOGAN LUCKY, assistimos a uma comédia de superfície, sem profundezas narrativas; sem profundidade crítica; com pouca imersão cinematográfica.
O longa apresenta Jimmy Logan que, ao ser demitido, convence seu irmão Clyde e sua irmã Mellie a participarem de um roubo. O alvo é o autódromo Charlotte Motor Speedway, durante uma corrida da NASCAR. Para colocar o plano em prática, os irmão Logan precisam da ajuda de Joe Bang, criminoso com experiência em explosões e que está cumprindo pena. Portanto, eles precisam planejar a fuga de Joe para que consigam explodir o cofre do autódromo e fugir com o dinheiro.
O principal aspecto cômico está na equipe de assalto. Para que o público possa se identificar com eles, o longa mostra algumas motivações dos personagens. Assim, o público aceita a premissa e fica confortável para torcer pelo sucesso do grupo. Ainda no primeiro ato, apresenta a estrutura básica da estratégia. Aqui, aliás, está outro ponto inusitado: a ideia tem tudo para dar errado. A falta de um plano perfeito é o alicerce da expectativa de humor. Com assaltantes engraçados e um plano resumido a uma lista de 10 passos, parece que a produção vai nos roubar alguns sorrisos.
Isso acontece, mas não com tanta frequência quanto o próprio filme parece desejar. Quando ocorre, tem como base as boas interpretações de Adam Driver (como Clyde) e Daniel Craig (como Joe Bang). Driver compõe um personagem introspectivo que provoca risos pelas sutilezas, pela entonação da fala e pela quebra de expectativas. Craig construiu um Joe Bang com boas oscilações entre sarcasmo e irritabilidade.
Além disso, a construção de todos os personagens de “Logan Lucky” é um retrato da cultura local sem cair no deboche. O diretor não ridiculariza seus personagens e consegue manter um tom narrativo em que utiliza os excessos como artifício de humor. Logo, as características regionais são respeitadas, atribuindo o humor ao exagero; não à cultura.
Entre as características da cinematografia, o experiente Steven Soderbergh utiliza na direção enquadramentos e movimentos simples de câmera. É interessante que ele aplica alguns recursos como o plano contreplongée como construção do humor. Exemplo disso é quando os irmão Logan encontram Joe Bang na prisão. Uma das tomadas é feita com um ângulo contreplongée, o que, geralmente, é utilizado para destacar o poder do personagem em tela. Nesse caso, ao considerarmos os demais elementos da cena, percebemos o uso quase satírico deste recurso.
Os demais recursos narrativos não são envolventes como a fotografia do filme. É evidente que a incerteza em relação ao plano elaborado pelos personagens é um elemento que gera curiosidade no público. No entanto, a montagem compromete o ritmo dos acontecimentos. É feita de forma linear e com pouco vigor, sem explorar possibilidades mais criativas, apenas encaixa uma cena após a outra.
O roteiro, por sua vez, deixa de explorar de forma significativa seus subtextos. Surgem pequenas críticas sociais direcionadas à desigualdade econômica, à dinâmica das prisões, às prioridades do governo e ao tratamento aos veteranos de guerra. Porém, “Logan Lucky” não aprofunda as discussões em qualquer dessas críticas. Fica apenas na tenra citação dos problemas, deixando uma sensação de “poderia ter sido, mas não foi”.
O longa poderia ter aproveitado o engajamento do público com o assalto, a boa interpretação do elenco e o aspecto inusitado do plano para tratar desses assuntos. Poderia ter cortado o terceiro ato, desnecessário, e explorado melhor os temas que já tinha construído. Poderia ter criado mais diálogos, aproveitando as quebras de expectativas das melhores cenas. Poderia… mas não fez.
LOGAN LUCKY chega a duas horas, mas deveria ter menor duração. Se cortasse os excessos e trouxesse maior dinamismo à narrativa, seria mais marcante. Por isso, assim que acaba, você lembra apenas que a prótese do personagem de Driver “não é um braço, mas uma mão”… e sorri.
Redator especialista em comportamento que busca no Cinema os diversos sentidos da vida.