“WIFI RALPH: QUEBRANDO A INTERNET” – O pecado da longa duração
Em 2012, “Detona Ralph” desagradou a algumas expectativas exigentes que desejavam um filme repleto de referências aos jogos de videogame dos anos 1980 – o número de citações foi menor do que se esperava e boa parte da narrativa se concentrou em um único jogo de corrida fictício, o “Corrida doce”. Já em 2019, WI FI RALPH: QUEBRANDO A INTERNET atende às esperanças por mais referências, agora do mundo online, porém comete um pecado considerável: abusa da longa duração e de um conflito dramático repetido do antecessor.
A continuação coloca Ralph e Vanellope em outra aventura: encontrar uma peça para salvar o jogo “Corrida doce”; para tal, os dois precisarão penetrar na internet e contar com a ajuda dos serviços da web e de seus “habitantes”. Dessa vez, toda a estrutura narrativa depende das inúmeras citações de aplicativos e sites famosos, de funções dos computadores e de personagens de entretenimento: Pacman, Sonic, vírus de computador, anúncios publicitários, Instagram, Google e Disney são algumas das muitas referências que povoam o arco atravessado pelos protagonistas – é necessário percorrer os ambientes daquele universo e agir segundo suas regras.
O maior mérito da animação é a utilização dos efeitos visuais para criar os espaços dentro da internet com uma inventividade digna de elogios. A rede mundial de computadores é concebida como uma grande cidade povoada por diferentes locais, prédios e usuários, estes sob a forma de avatares em tráfego constante. Os muitos detalhes também revelam a decisão de adaptar traços virtuais a características espaciais: as distâncias são medidas por megabytes, a central de conexão da internet é um aeroporto com distintas saídas, a barra da busca do Google é uma biblioteca com um avatar de chapéu de catedrático responsável pelas pesquisas, o Instagram é um salão de arte com exposição de imagens, dentre outros.
A criação de universo não depende apenas de bons efeitos computadorizados, mas também do uso eficiente do 3D. Aproveitando-se de uma profundidade de campo elevada, que deixa em foco o que está em primeiro plano e ao fundo, a sensação de imersão e de dinamismo é muito grande. A computação gráfica igualmente ajuda na composição dos variados cenários: um jogo de corrida perigoso é mostrado em locações sujas, intimidadoras e sob um tom sépia; o site de vídeos “Buzzztube” é exibido sob uma luz azul agradável e com muitos telões espalhados pelo local, remetendo a uma exposição de carros (os vídeos são expostos em palanques em busca de likes); e toda a internet ganha contornos escurecidos e fica em ruínas após a liberação de um vírus.
Quando se trata da concepção gráfica dos personagens, ela não é feita, em sua maioria, para ilustrar o serviço que fazem. Ainda assim, os traços são criativos e seguem uma lógica de animação própria (efeitos bidimensionais para retratar os mais antigos, movimentos que remetem ao slow motion para alguns jogos de fliperama e a animação fluida e contemporânea da computação para os mais modernos). Os melhores segmentos e piadas da narrativa vêm do desconhecimento dos protagonistas acerca do universo novo onde estão: não sabem como funcionam os jogos online; se deparam com inconvenientes pop ups de anúncios e com a perigosa deep web, onde os vírus são criados; e transitam pela cultura do entretenimento. Destaque à parte para o momento em que eles veem ou conhecem personagens da Marvel, de Star Wars e as princesas da Disney, quando o humor sobe de nível e rende a melhor piada ao satirizar as convenções dos filmes de princesa.
Pena que o desenvolvimento dos arcos dramáticos de Ralph e Vanellope seja uma falha grave do roteiro. Ao invés de trabalhar o tema do choque de gerações através das diferenças entre jogos antigos e modernos, o filme prefere reciclar a mensagem do valor da amizade, já abordada pelo longa anterior. Torna-se muito perceptível o prejuízo das escolhas temáticas à narrativa durante a transição do segundo para o terceiro ato: os conflitos dos protagonistas são introduzidos muito rápida e superficialmente através de um única sequência nos primeiros minutos; em seguida são esquecidos e só são retomados nos momentos finais de modo inesperado; além disso, esse processo débil ainda cria uma antagonismo provisório para Ralph que soa pobre, banal e à serviço de uma mensagem edificante genérica.
“Wifi Ralph: quebrando a internet” acerta em cheio quando constrói seu universo de referências, tornando-o orgânico dentro da narrativa e engraçado. Entretanto, quando tenta ir além disso, falha de maneira muito contundente no que se refere ao tempo de duração (excessivo) e ao desfecho das trajetórias de Ralph e Vanellope (descompassadas). A partir do instante em que passa a falsa impressão de que está próxima do fim é que a animação encontra seu pecado: não saber quando colocar o ponto final.
Um resultado de todos os filmes que já viu.