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“UM PAI PARA LILY” – A simplicidade que toca a alma

Em um cenário onde histórias sobre paternidade costumam seguir caminhos previsíveis e até mesmo clichês, UM PAI PARA LILY surpreende ao explorar com delicadeza temas mais profundos, como a dependência emocional e a necessidade de autocrítica, embutidos em uma narrativa que parece simples à primeira vista. O filme se afasta dos clichês tradicionais ao tratar a relação entre pais e filhos sob uma perspectiva mais humana e sensível, mostrando que nem sempre o laço de sangue é suficiente para oferecer o suporte emocional de que uma pessoa precisa. O resultado é uma obra modesta, mas cheia de calor humano, capaz de aquecer o coração sem forçar emoções, remetendo àquela sensação nostálgica e reconfortante de uma boa sessão de cinema em uma tarde preguiçosa, onde o que importa não é a grandiosidade da trama, mas o impacto silencioso que ela deixa após o final.

A trama gira em torno de Lily Trevino, uma jovem solitária em seus vinte e poucos anos, que luta para encontrar seu lugar no mundo enquanto carrega as cicatrizes de uma relação conturbada com seu pai biológico. Em meio a essa jornada silenciosa, ela acaba conhecendo, por acaso, um homem online que compartilha o mesmo nome de seu pai, um encontro que parece banal, mas que acaba mudando profundamente sua trajetória.  A amizade que nasce dessa relação improvável se transforma em um poderoso catalisador para que Lily encare seus medos, suas fragilidades e seus ressentimentos mais profundos, ao mesmo tempo em que a impulsiona a redescobrir seu próprio valor e a construir, pela primeira vez, uma visão mais amorosa e generosa sobre si mesma. Trata-se de um encontro que, mesmo virtual, ilumina caminhos de cura emocional em um momento crucial de sua vida.

(© Synapse / Divulgação)

Dirigido por Tracie Laymon, “Um pai para Lily” parte de uma premissa que poderia soar excessivamente fantasiosa se não fosse baseada em uma história real. O roteiro, também assinado por ela, navega com habilidade entre momentos de humor leve e instantes de maior sensibilidade, sem jamais subestimar a emoção genuína da jornada de Lily. Barbie Ferreira, conhecida por papéis que mesclam vulnerabilidade e força, entrega uma atuação tocante, moldando Lily como uma personagem que, embora marcada pela solidão e inseguranças, carrega uma imensa capacidade de se reconstruir. John Leguizamo, no papel de Bob Trevino, é carismático e oferece um contraponto necessário: sua presença é acolhedora e nunca forçada, trazendo humanidade ao personagem que simboliza o “pai que poderia ter sido”.

Outro acerto do longa é a forma como a diretora conduz a evolução dos personagens de maneira orgânica. French Stewart, como Robert Trevino, o pai biológico de Lily,compõe um retrato sutil de um homem egocêntrico e emocionalmente indisponível, que flerta com a caricatura vilanesca sem perder a credibilidade. Já Lauren Spencer, no papel de Daphne, amiga de Lily, serve como um reforço de esperança e incentivo no momento em que a protagonista precisa se apoiar em novas bases.

A estética do filme também merece destaque: a fotografia aposta em tons quentes e suaves, que casam perfeitamente com a sensação de acolhimento que a história busca transmitir. A trilha sonora, ainda que discreta, acompanha de maneira eficaz as nuances emocionais dos personagens, sem soar invasivo ou melodramático.

No final das contas, “Um pai para Lily” é exatamente aquilo que promete ser: um filme singelo e sincero sobre encontrar apoio nos lugares mais inesperados. Sem recorrer a grandes reviravoltas ou a dramatizações exageradas, o longa conquista justamente pela forma honesta e delicada com que trata sentimentos complexos, como abandono, carência e o desejo silencioso de pertencimento. Sua força está na simplicidade dos gestos e na verdade emocional que transborda de pequenas cenas, provando que nem sempre é preciso grandiosidade para tocar o coração do espectador. Em um mundo que frequentemente exige histórias espetaculares para emocionar, este filme é um lembrete valioso de que, muitas vezes, é na leveza e na sutileza que se encontram as histórias mais genuínas e inesquecíveis.