“TOY STORY 2” – Envelhecimento x amor
* Clique aqui para ler a crítica do primeiro filme.
“Toy story” foi lançado em 1995, a princípio, como uma animação única que se fechava em si mesmo com uma narrativa de arco completo. Então, poderia parecer que a continuação, quatro anos depois, apenas buscaria explorar uma história de sucesso com fins comerciais. Ledo engano: TOY STORY 2 consegue desenvolver a trajetória daqueles personagens para outras boas direções, aprimorando o aspecto técnico, mantendo a diversão e agregando um lado sentimental.
Na aventura da vez, Woody tenta salvar um boneco de ser vendido em um bazar de usados e acaba sequestrado por um colecionador de brinquedos, que pretende vendê-lo a um museu japonês. Na casa do sequestrador, descobre que foi o protagonista de um antigo programa de TV e conhece Mineiro, Jessie e Bala no Alvo, outros membros do seriado. Enquanto isso, Buzz, Rex, Slink, Senhor Cabeça de Batata e Porquinho organizam uma missão de resgate para reencontrar seu companheiro. A partir da nova história, os conhecidos personagens estarão diante do embate entre se sentirem amados ou sofrerem os efeitos do envelhecimento.
A sinopse pode sugerir a repetição do primeiro filme porque novamente há uma missão de resgate de personagens em perigo e a volta à casa do Andy. Porém, a escala da aventura assume aqui um lado sentimental maior que apresenta aos brinquedos uma realidade futura muito possível e amedrontadora para eles: ser abandonado por conta de algum defeito causado pelo tempo e esquecido por conta do amadurecimento de seu dono, que se interessaria por outras atividades. A trajetória de Woody revela tais temores ao mesmo tempo que expande o universo da obra, desde o momento em que rasga seu braço e é roubado pelo colecionador – o caubói enfrenta o medo do descarte por Andy, devido ao seu defeito e conhece Mineiro, Jessie e Bala no Alvo, com quem aprende que os donos não mantêm seus bonecos eternamente e que deve buscar uma alternativa, nem que seja exposição em uma embalagem fechada (as perguntas “Andy vai te levar para a faculdade? Para a lua-de-mel? de Mineiro e as lembranças de Jesse sobre sua antiga dona impactam Woody).
Enquanto o sentimentalismo ganha a narrativa, a diversão é menosprezada. Ela está presente no resgate a Woody, composta por piadas relativas ao seu próprio universo e às referências ao cinema: por exemplo, a abertura que parece ser uma aventura espacial, mas se trata de um jogo de videogame entre Buz e Rex para derrotar o vilão Zurg; as tiradas cômicas do Porquinho e do Senhor Cabeça de Batata sobre as moedas que o primeira carrega dentro de si e as peças que compõe o segundo e os comentários sarcásticos feitos por ele; e as gags visuais sobre “Jurasick Park”, a partir da imponência física de Rex, e de “Star Wars”, através do jogo que emula a ficção científica e a cena entre Buzz e Zurg que referencia um famoso momento entre Darth Vader e Luke Skywalker.
Além de combinar sentimento e diversão, o segundo filme também aprimora seu aspecto técnico dando atenção a alguns elementos da linguagem cinematográfica. O contraste entre os medos do envelhecimento/efeitos da passagem do tempo e o amor nutrido por uma criança é pontuado pelo jogo de claro e escuro na iluminação: os momentos em que Woody e seus amigos se sentem confiantes, amados, unidos ou idealizados são fotografados com cores fortes, como a brincadeira do caubói com o cão Buster, a exibição do programa de TV e dos objetos relacionados a Woody e a parte positiva das recordações do passado de Jessie; já os instantes felizes ou deturpação do sentido da posse dos bonecos são iluminados com cores frias e escurecidas, como o pesadelo de Woody de ser jogado no lixo, a aflição de ser colocado na empoeirada prateleira do quarto de Andy e a tristeza de brinquedos serem guardados na escuridão de uma caixa escura.
A dimensão de diversão é potencializada pela evolução visual conduzida por John Lasseter. O diretor cria sequências de ação dinâmicas, de uma escala de desafio ainda maior e pensadas com cuidado estético, como se vê nas cenas do elevador (desconfortável em um espaço apertado) e do bagageiro de um aeroporto (um ambiente ameaçador e cartunescamente grandioso). Além disso, não há como não notar o aperfeiçoamento do design dos brinquedos, através dos movimentos mais fluidos e dos detalhes corporais (como o algodão soltando do braço de Woody) criados por computação gráfica. São recursos que expandem o universo temático e estético da produção sem parecer pretensioso.
Há ainda outro elemento dramático no roteiro: os hábitos dos colecionadores de reunir uma galeria de brinquedos ainda embalados ou pouco usados para desfrutar do que eles significam comercialmente. O colecionador e o Mineiro são figuras que representam, respectivamente, a disposição de guardar uma “relíquia” mesmo sem ter experiências emoções com ela e o desperdício de oportunidades de desfrutar situações felizes em razão de algum futuro eventualmente triste. Contrariando a perspectiva desses personagens, os demais brinquedos aprendem novamente que eles podem se realizar por pertencerem a uma criança que lhes dá amor e passagens verdadeiramente emocionais para se lembrar. Um mérito que “Toy story 2” possui ao trabalhar uma questão sentimental e antever o futuro daqueles bonecos sem abrir mão do entretenimento.
Um resultado de todos os filmes que já viu.