“THE TITAN”: Distopia paupérrima em termos cinematográficos
O ano é 2048, o local é uma fictícia base da OTAN. O planeta está se deteriorando e a humanidade corre risco de ser extinta. Rick Janssen é um piloto selecionado para participar de um programa científico por meio do qual sua fisiologia será alterada, para que possa ir para Titã, a maior lua de Saturno. A ideia é, em longo prazo, fazer com que toda a humanidade migre para lá – isso se a experiência der certo. Inicialmente favorável, Abigail, esposa de Rick, vai aumentando seu receio ao perceber no que o marido está se transformando. É esse o plot de THE TITAN, novo filme original Netflix.
Suavemente inspirado em “Avatar”, James Cameron teria razões para se indignar com a comparação, pois “The Titan” é uma distopia paupérrima em termos cinematográficos. A presença de Sam Worthington como o protagonista Rick é um indício tanto da similaridade com o filme de Cameron quanto da má-qualidade da nova película. Isso porque, depois de conhecer Pandora e os Na’vi, o ator definitivamente não conseguiu se dar bem em nenhuma produção boa (no máximo, foi coadjuvante em “Até o último homem”). Hoje, infelizmente, Worthington é sinônimo de filme fraco – também pudera, sua interpretação é regularmente fajuta, atuando sempre no mesmo papel (interpreta, portanto, a si mesmo).
Ao que parece, o roteiro não teve preocupação alguma em dar profundidade às personagens – claro que, no caso do protagonista, isso de nada adiantaria, por ineficácia do ator. Inteligente ao investigar e perceptiva ao identificar que há algo errado no experimento científico, Abigail (Taylor Schilling) é um pouco mais interessante, não sendo culpa da atriz a incoerência da personagem ao final, que perde um pouco da sua racionalidade. Noah Jupe (o Jack Will de “Extraordinário”) vive o filho do casal e está no filme apenas para colocá-lo no currículo, pois é completamente irrelevante. O talento de Tom Wilkinson acrescenta bastante ao tornar o Professor Collingwood menos unidimensional e mais dúbio. Diego Boneta tem um papel mais instigante, pois Hernandez parece participar do projeto a contragosto – pessimista, ele dá a entender que acredita que tudo dará errado. Entretanto, sua participação é minúscula – e, a rigor, indiferente no script.
A direção de Lennart Ruff é quase risível, como quando coloca personagens fumando para expressar o seu estresse. Não que isso não aconteça na vida real, mas o recurso visual é bastante clichê (pior que isso, apenas se colocasse o estresse em uma fala). A direção de arte é razoável, em especial na casa em que Rick e Abigail residem (grande, bonita, modernista – lembrando um pouco o quadro “Nighthawks”, de Edward Hopper – e tecnológica), todavia o CGI é extremamente artificial. Outro problema grave reside na montagem, que depende de enormes elipses para transformar as cobaias em um ser humanoide que mais parece alienígena. As elipses são ruins porque não permitem ao público captar eficazmente a passagem do tempo, isto é, da maneira como são feitas, os saltos ficam excessivamente grandes.
O argumento do longa não é ruim: as mazelas que hoje são previstas na vida real (superpopulação, degradação ambiental, guerras devastadoras, fome etc.) recebem uma versão sci-fi com vocação, em tese, para o suspense, no qual mulheres e homens aceitam ser cobaias para quiçá se tornarem heróis. Contudo, o roteiro é sofrível: além de cientificamente questionável (como injeções, soro e somente duas cirurgias conseguem transformar as pessoas daquele modo?), possui algumas incoerências – por exemplo, se o mundo teve guerras, como ainda existiria a OTAN? – e contradições. O terceiro ato é caótico e incongruente. Como pessoas tão calmas poderiam mudar seu comportamento em um flash (mais um exemplo da montagem ruim)? Que função exerce Freya (Agyness Deyn)?
O desfecho também é duvidoso, não se decidindo entre o niilismo e o otimismo. Considerando a ausência de novidade e a falta de qualidade, há pouco que se aproveite de “The Titan”. Mesmo não chegando ao nível torturante, é um filme totalmente dispensável. Sua maior virtude é que dura pouco (cerca de uma hora e meia): se durasse mais, aí sim poderia se tornar uma tortura.
Desde criança, era fascinado pela sétima arte e sonhava em ser escritor. Demorou, mas descobriu a possibilidade de unir o fascínio ao sonho.