“SEM PAGAR ALUGUEL” – A liberdade ilusória [48 MICSP]
A juventude é uma fase repleta de inquietações e ilusões de que a vida sempre se ajeita. SEM PAGAR ALUGUEL registra esse sentimento ao seguir dois amigos que, em um momento de desespero emocional e financeiro, decidem viver um ano inteiro sem pagar aluguel, contando com a ajuda de amigos, familiares e estranhos. O filme promete boas risadas, mas deixa a desejar ao tratar superficialmente os dilemas enfrentados por quem tenta desafiar o sistema e as realidades da vida adulta.
A trama acompanha Ben e Jordan, dois melhores amigos que, diante de uma crise pessoal, criam um plano para viver “de graça”: pretendem se hospedar na casa de conhecidos, evitando pagar o aluguel e sobrevivendo com a ajuda de quem puder. Porém, conforme a jornada avança, eles descobrem que a ideia de viver sem responsabilidades não é tão simples quanto parece. Logo, os desafios que enfrentam se tornam maiores e mais complexos do que haviam previsto, revelando as fragilidades de um estilo de vida despreocupado.
Dirigido por Fernando Andrés, o filme tenta equilibrar humor e crítica social, especialmente sobre a idealização que muitos jovens têm de uma vida sem compromissos e a crença de que tudo sempre se resolverá facilmente. A interpretação de Jacob Roberts como Ben se destaca, trazendo autenticidade ao personagem que se encontra dividido entre o desejo de liberdade e a dura realidade que começa a se impor. Ao lado de David Vidal Treviño, que interpreta Jordan, ambos sustentam a química que torna os momentos cômicos do filme funcionais e envolventes. Entretanto, o roteiro falha em explorar mais profundamente a amizade entre eles, que poderia ser uma força significativa na narrativa e nas transformações de ambos.
Embora o relacionamento entre Ben e Jordan seja o núcleo emocional do filme, sua profundidade é apenas arranhada. O filme tem momentos que flertam com a possibilidade de abordar as implicações mais sérias de uma amizade tão intensa — como o impacto que isso tem em suas escolhas e no amadurecimento de cada um. Contudo, o diretor hesita em aprofundar esses temas, preferindo manter o tom leve e as situações cômicas, o que enfraquece o impacto emocional da história. Assim, a jornada dos protagonistas acaba se tornando uma série de episódios engraçados, mas que não provocam uma reflexão mais profunda sobre os desafios que a vida impõe. Ao fazer isso, perde a oportunidade de oferecer uma análise mais abrangente sobre as dificuldades de encontrar independência e estabilidade em um mundo onde nada é fácil ou garantido.
Apesar disso, a obra ainda tem seus méritos, principalmente nas atuações de seus protagonistas, que conseguem transmitir a essência do que significa ser jovem e inexperiente. A interação entre eles é repleta de diálogos naturais e situações engraçadas, mas também reflete a fragilidade típica dessa fase da vida.No fim das contas, o longa acerta ao trazer boas risadas e uma leve crítica à crença ingênua de que a vida sempre se resolve facilmente. No entanto, não explora de forma mais complexa o amadurecimento de seus personagens. A mensagem que poderia ser mais impactante sobre a inquietude juvenil e os desafios da amizade é diluída em um roteiro que opta por não se comprometer com essas questões, resultando em uma obra que, embora divertida, deixa um sabor de oportunidade perdida. A juventude é uma fase que merece ser explorada em toda a sua complexidade, e “Sem Pagar Aluguel” poderia ter sido uma janela para essas experiências.
* Filme assistido durante a cobertura da 48ª edição da Mostra Internacional de Cinema em São Paulo (São Paulo Int’l Film Festival).
Um verdadeiro apaixonado pelo cinema, que encontrou nas palavras a maneira ideal de expressar as emoções e reflexões que cada filme desperta.