“PEDRO” – Viagem à Índia ou sessão de tédio [46 MICSP]
Como conjunto, as cenas de PEDRO dizem pouco; isoladamente, porém, elas demoram muito. O longa indiano tem uma proposta muito bem estabelecida e é completamente fiel a ela, uma fidelidade que, todavia, o torna entediante em razão do excesso.
Pedro é um homem sem amigos e constantemente embriagado que mora em uma pequena vila indiana. Depois de alguns acontecimentos, como matar acidentalmente uma vaca, ele se torna cada vez mais inimigo de todos.
A sinopse do longa pode sugerir um anti-herói incompreendido, mas não é bem esse o caso. Não fica claro o motivo pelo qual Pedro é destinatário de uma antipatia geral, o que se torna ainda mais estranho, no início, pelo fato de ele assumir um trabalho de risco (subir em postes de eletricidade para consertá-los). Aliás, um homem respeitado do vilarejo lhe dá até mesmo um novo trabalho, o que indica algum nível de confiança. Entretanto, essa noção inicial do contexto em que o protagonista se insere é derretida à medida que ele revela um certo ímpeto de agir em desacordo aos demais. É o que se extrai, dentre outros, do seu comportamento claramente provocativo na cerimônia para Ganapati (uma das principais deidades do hinduísmo), ou da atitude agressiva em relação a Vinnu quando fica fora de casa.
O filme de Natesh Hegde (roteirista e diretor) melhora proporcionalmente à dissonância entre o comportamento de Pedro e o que sua sociedade esperava dele. O problema é que os acontecimentos demoram muito para acontecer; a morte da vaca, por exemplo, ocorre após cerca de cinquenta minutos de filme. É fácil perceber que seus quase cento e dez minutos poderiam ser reduzidos para, sem exagero, sessenta. Nem todas as cenas são desnecessárias, mas a maioria delas se arrasta desnecessariamente, como a cena interminável do corte de cabelo.
Não se ignora que a mise en scène de Hegde é propositalmente naturalista e lenta, além de minimalista. A cena inicial serve de indicativo de tudo o que se segue: bastante observação da natureza em detrimento de uma narrativa. Há uma valorização do ambiente natural, com muita chuva (transmitindo as adversidades encontradas no seio social) e cenários com árvores, folhas, lagos e musgos. Do ponto de vista sonoro, prevalecem quase integralmente os ruídos intradiegéticos (animais, chuva etc.), em um trabalho de som bem imersivo (a primeira música extradiegética surge aos quarenta e cinco minutos).
O que se torna problemático é o excesso da natureza em uma lentidão sofrível. Os planos são majoritariamente estáticos, mas variam no enquadramento, o que ainda assim não confere dinamicidade à obra. São poucos os diálogos e o filme é econômico, igualmente, na montagem (igualmente assinada por Hedge). Não obstante, é mais preciso afirmar que o filme abre uma porta para a imersão e depende, para o seu funcionamento, que essa porta seja acessada pelo público. Contudo, o acesso não é fácil e não faz concessões: é indispensável que o espectador se sinta mergulhando naquela realidade e ignore o quão estática a narrativa consegue ser, justamente por prestar atenção na estética (já que a película não oferece nada além da estética). Pode ser uma deliciosa viagem à Índia ou uma sessão de tédio inesquecível. Mais provável a segunda hipótese.
* Filme assistido durante a cobertura da 46ª edição da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.
Desde criança, era fascinado pela sétima arte e sonhava em ser escritor. Demorou, mas descobriu a possibilidade de unir o fascínio ao sonho.