“PARA TODOS OS GAROTOS: P.S. AINDA AMO VOCÊ” – Como assim não existe o “felizes para sempre”?
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“E viveram felizes para sempre”. Em PARA TODOS OS GAROTOS: P.S. AINDA AMO VOCÊ, continuação de “Para todos os garotos que já amei”, Lara Jean está prestes a descobrir a incompatibilidade entre essa frase e o mundo real. A grande questão é: como se relacionar após essa descoberta?
Em continuidade aos eventos do primeiro filme, Lara Jean é oficialmente a namorada de Peter Kavinsky, agora sem fingimento. Tudo parece perfeito, até que John Ambrose, um dos “garotos que ela já amou”, responde a carta que lhe foi dirigida. Com isso, a protagonista mergulha em dúvidas sobre seus próprios sentimentos.
O roteiro de Sofia Alvarez e J. Mills Goodloe (baseado no livro de Jenny Han) é bastante fiel à jornada do herói. Lara Jean parece feliz com Peter (mundo comum) quando é abalada pela carta de John (chamado à aventura). Inicialmente, ela prefere não responder (recusa ao chamado), até que conhece Stormy (encontro com o mentor), com quem reflete sobre o namoro. É tudo bastante mastigado e didático – aliás, caso alguém caia de paraquedas no longa, não é necessário assistir ao anterior, pois Kitty, irmã de Lara Jean, faz um resumo de tudo em apenas um diálogo.
Evidentemente, o problema não é seguir a estrutura da jornada do herói. Filmes clássicos fazem isso. O erro dos roteiristas está nas minúcias, com metáforas estúpidas desnecessariamente explicadas (a bola de cristal, a cerca viva etc.), subplots mal explorados (como o do pai de Lara Jean e o de Chris) e coadjuvantes sem relevância (como Lucas e Dorothy). Entre coincidências sem explicação (John escolheu o mesmo trabalho voluntário por simples acaso?) e conflitos repetidos (há muita reciclagem do plot do primeiro filme), seria possível ignorar tantos defeitos se houvesse maior esmero nos conflitos de Lara Jean.
É difícil aceitar um idiot plot no qual a heroína fica em dúvida entre um presente concreto perfeito e um pretérito abstrato duvidoso. Ainda que ela seja apenas uma adolescente (e que o filme seja voltado ao público pré-adolescente), não faz sentido que Lara Jean fique abalada pela carta de John, sendo que tudo está bem com Peter (da mesma forma, é inverossímil a persistência do encanto dele por ela, mas esse é o menor dos problemas da narrativa). Talvez percebendo o quão absurdo o texto se tornava, a solução adotada pelo roteiro (para resolver uma complicação criada por ele mesmo) é infiel às próprias premissas, destruindo o perfil de príncipe que havia sido moldado para Peter. O castelo construído até então se dissolve como se fosse feito de areia, o que ratifica a fragilidade dessa construção. A solução final? Não poderia ser mais artificial.
“Artificial” é uma palavra que descreve bem a direção de Michael Fimognari. Logo no prólogo, Lara Jean aparentemente canta e dança, porém na realidade é apenas lip sync. Não que isso seja mais um equívoco do longa, mas tem valor simbólico referente à artificialidade da produção. Mesmo que Lana Condor e Noah Centineo (respectivamente, Lara Jean e Peter) se esforcem e tenham química (aliás, o visível abismo de talento entre eles praticamente se esvaiu, leia-se, ele melhorou em relação ao trabalho precedente), a personalidade das personagens parece uma nota de três reais.
Do ponto de vista sonoro, a estética não funciona; visualmente, o excesso é incômodo. Na trilha musical as canções são genéricas e, geralmente, mal empregadas (lamentável o uso de “Girls just want to have fun”). A fotografia tem personalidade, o que não é exatamente um elogio: exagerada na saturação, o campo simula constantemente uma atmosfera onírica, sensação ampliada com a pouca profundidade de campo e a repetição de cores (Lara Jean com muito amarelo, Peter exclusivamente de azul ou cinza). Não por outra razão, a melhor cena, em termos visuais, é aquela em que a protagonista usa uma cor diferente das que costuma.
Existem flashes de qualidade em “Para todos os garotos: P.S. ainda amo você”. A ideia de colocar um novo terceiro (Jordan Fisher, discreto) na relação do casal é boa, mas mal trabalhada (começando por repetir a história das cartas). Algumas questões interessantes são mencionadas, como a perda da virgindade e a conexão entre duas pessoas (explicada por uma palavra coreana). Esses momentos, todavia, são tão efêmeros, que acabam sendo pulverizados pela obviedade da lição aprendida por Lara Jean. Como ela aprendeu que não existe “felizes para sempre”? Nem ela sabe, mas parece que isso não importa no filme. Como ela diz que aprendeu, resta aguardar pelo encerramento da trilogia. Dou-lhe uma, dou-lhe duas…
Desde criança, era fascinado pela sétima arte e sonhava em ser escritor. Demorou, mas descobriu a possibilidade de unir o fascínio ao sonho.