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“O SOL TAMBÉM É UMA ESTRELA” – É o amor

Mesmo não podendo ser aferido cientificamente, o amor existe e pode ser comprovado: eis a premissa de O SOL TAMBÉM É UMA ESTRELA. Enquanto filme, a obra não passa de um romance adolescente descartável, porém a comprovação a que se propõe é consideravelmente ambiciosa para moldes aparentemente modestos. A síntese não podia ser outra: não apenas o longa não atinge seu objetivo de convencimento como tampouco ultrapassa a linha da descartabilidade.

O enredo da película parte de uma contraposição: de um lado, Natasha é uma jovem cética e cientificista desesperada com a sua iminente deportação para a Jamaica; de outro, Danny é um rapaz prestes a encaminhar seu futuro profissional, mas ainda em dúvida sobre o que realmente quer, dada a sua alma artística. Quando se conhecem, ele propõe para ela comprovar a existência do amor, sentimento no qual ela não acredita e que reduz a hormônios.

Cartaz de “O Sol também é uma estrela

O primeiro problema do filme é que o roteiro de Tracy Oliver, baseado no livro homônimo de Nicola Yoon, tem como engrenagens narrativas coincidências sequenciais, como se, por motivos metafísicos, Danny e Natasha estivessem destinados a ficar juntos (a despeito da deportação prestes a ocorrer). Mesmo abraçando a suspensão da descrença, a trama é rocambolesca e minada por clichês e inverossimilhanças (por exemplo, como, depois da “bronca”, o pai de Natasha permite que ela fique sozinha com Danny? Por que a cobrança sobre Danny é maior do que sobre seu irmão?). O incidente incitante não é ruim, pautado no embate razão versus emoção. Entretanto, tudo o que se segue é construído de maneira plástica: os conflitos são clichês e, o que é ainda mais grave, a crise já é de conhecimento do público, o que esvazia por completo o momento. Na prática, é uma narrativa sem surpresas, o que é decepcionante considerando a atualidade do contexto em que a trama se insere.

Do ponto de vista temático, a escolha dos pilares é muito boa, com enfoque na justificativa para o afeto e no confronto entre gerações. No primeiro caso, trata-se do fio condutor da narrativa, que é esquecido no texto expresso, mas se mantém no subtexto. Todavia, o romance é tão artificial e efêmero que a proposta não se cumpre. No que se refere ao confronto entre gerações, Natasha e Danny são típicos representantes da chamada geração Y (ignorando a questão cronológica, que o filme não especifica), marcada por uma passionalidade maior que a de seus antecessores, muito mais racionais. A dupla principal é ambiciosa dentro de seus próprios objetivos, isto é, eles não se importam tanto com o ganho financeiro, mas sim com a satisfação pessoal, ao contrário de seus pais, cuja preocupação é unicamente a prosperidade da prole, ainda que em detrimento (parcial) da felicidade. O subtexto é riquíssimo e muito conveniente para o público-alvo, porém a abordagem superficial é uma verdadeira oportunidade perdida.

É bastante clara a inabilidade de Ry Russo-Young em traduzir a linguagem literária para a cinematográfica. A despeito de uma tentativa em ser poética, a diretora infla a produção com desnecessidades manifestas. É o caso, dentre outros, de inserções explicativas extradiegéticas (Carl Sagan e Hugh Everett podem fazer sentido no livro, mas no filme não passam de elucubrações dispensáveis que desviam o foco do que deveria ser o principal) em narração voice over com esclarecimentos supérfluos (qual a relevância de como os pais de Natasha se conheceram?) – sem olvidar planos gerais belíssimos na cidade de Nova Iorque (em especial quando a câmera se inclina), mas inquestionavelmente inúteis. A trilha musical passa uma impressão de qualidade e coesão narrativa, porém ela se destaca justamente pelo vazio de conteúdo – é mais interessante prestar atenção nas canções do que no filme em si (ou talvez na ausência de filme).

Tudo é tão artificial e vazio na película que uma cena de karaokê parece mero lip sync de conhecimento até das personagens. Não por culpa dos artistas, pois os belos Yara Shahidi e Charles Melton se esforçam para fazer um bom trabalho, impedido por uma Natasha avoada e um Danny exageradamente autoconfiante na interação com ela (qualquer um sabe que a cena sem camisa, dentre outras, serve apenas para empolgar as adolescentes fãs do astro de “Riverdale”).

No entanto, nem tudo é ruim em “O Sol também é uma estrela”. Inofensivo e bem-intencionado, o filme aproveita questões bem contemporâneas (como a imigração nos EUA) e dá espaço representativo a uma dupla que, geralmente, não o receberia em um romance (uma negra e um oriental). Ainda que de maneira rasa, é uma obra sobre amor. Em tempos de ódio e discriminação, esse assunto se justifica por si só.

P.S.: ou a filmagem foi feita sem um foquista, ou o projetor da sala de cinema estava estragado.