“MISSÃO: IMPOSSÍVEL – NAÇÃO SECRETA” – Espionagem, ação e boa técnica
Se assumindo mais do que nunca como um filme de espionagem com ação, MISSÃO: IMPOSSÍVEL – NAÇÃO SECRETA acerta em praticamente todos os aspectos a que se propõe. Provavelmente o auge da franquia (ao menos até então), o filme parece ter encontrado a fórmula para não mais errar.
No longa, Ethan Hunt precisa enfrentar uma organização secreta conhecida como Sindicato, que reúne ex-agentes de vários países, dados como mortos, agora dedicados ao crime. Após ser capturado por eles, Ethan consegue fugir com a ajuda de uma mulher misteriosa, a desconhecida Ilsa Faust. Ao entrar em contato com William Brandt, Diretor de Operações de Campo da IMF (Impossible Mission Force), é informado que Alan Hunley, diretor da CIA, conseguiu dissolver a IMF, o que obriga que todos os agentes se apresentem à Agência. Sabendo que ninguém acredita na existência do Sindicato, Ethan decide enfrentá-lo sem a autorização de seus superiores, contando com a ajuda de Benji, mas sendo perseguido por Hunley.
A trama é muito mais robusta que a dos antecessores, repleta de reviravoltas – mas sem exagerar ou cansar – e complexa ao criar dois antagonistas para Ethan. O primeiro é Solomon Lane, o líder do Sindicato, sobre quem o protagonista não sabe quase nada. Lane tem um perfil semelhante a outro vilão da franquia, Owen Davian (vivido pelo excelente Philip Seymour Hoffman), causando temor pela frieza e pela inteligência enquanto deixa o trabalho “braçal” para seus capangas. Sean Harris foi uma escolha acertada para o papel, pois até mesmo sua voz peculiar é ameaçadora. Outro antagonista é o Hunley do satisfatório Alec Baldwin: embora pertença ao sistema, advoga contrariamente à IMF, sendo a prisão de Ethan a sua obsessão. Porém, Hunley é inteligente o suficiente para saber agir diante de boas oportunidades para si.
Tom Cruise, Simon Pegg, Ving Rhames e Jeremy Renner repetem, respectivamente, os papéis de Ethan, Benji, Luther e Brandt. Benji é mais uma vez o alívio cômico, inclusive repetindo a piada em que minimiza os esforços hercúleos de Ethan em empreitadas que são apenas “difíceis, mas não impossíveis”. Porém, é a primeira vez que Benji enfrenta o protagonista ao querer participar mais da missão por ser seu amigo e por ser agente de campo. Trata-se de um avanço na personalidade da personagem, no que Pegg não vai tão bem quanto no humor, mas convence. Brandt quase não muda em relação ao filme anterior. Dessa vez, sua dubiedade é um fator que acrescenta à trama, já que não se sabe de que lado ele está (de Ethan ou de Hunley). Renner não se dá bem nas cenas de ação, mas é razoável quando o papel exige dramaticidade. Quanto a Cruise, parafraseando Luther, é “o mesmo Ethan de sempre” – ou seja, impecável no papel.
Outras personagens que agregam ao plot são Chief Atlee (Simon McBurney), engrenagem narrativa que aumenta as proporções da missão, e Ilsa Faust, a enigmática femme fatale interpretada pela ótima Rebecca Ferguson. É com ela que surge o subtexto de crítica ao “sistema”, todavia, além disso, é a personagem mais interessante do longa, pois é muito difícil saber quais as suas reais intenções e para quem realmente trabalha. Ilsa não é sexualizada, mesmo se apresentando como sedutora, tampouco donzela indefesa, ainda que Ethan a ajude. Seus atos contraditórios e a expressão indecifrável de Ferguson são pontos fortes da película. Diversamente dos filmes anteriores da franquia, aqui existem “mocinhos” trabalhando com criminosos e vilões nos serviços secretos, algo muito mais amplo que a corrupção em agências estatais ou meros agentes duplos.
Na direção, Christopher McQuarrie (que também assina o roteiro) mantém elementos que são marca da franquia, como uma sequência épica – aqui, quando Ethan se segura pela porta de um avião alçando voo (o que se torna não apenas crível, mas incrível, ao saber que Tom Cruise, como sempre, está realmente em cena – sem usar dublê) -, uma sequência de tensão (a da água), uma perseguição (a corrida em Casablanca é eletrizante), cenários mundiais (como o Piccadilly Circus, em Londres) e a surpresa no uso de máscaras.
A trilha musical da película inova ao se apropriar da ária “Nessum dorma” (cantada em uma cena e com melodia repetida em alguns momentos) e a montagem engana o espectador ao driblar o Efeito Kuleshov (efeito em razão do qual a interação entre planos induz o espectador a inferir que entre eles há uma relação intrínseca no espaço e/ou no tempo). A fotografia é bastante criteriosa ao usar cores frias na cena da água e cores quentes (em especial o amarelo) em Casablanca. O figurino é preciso: Lane usa preto, afinal, ele é o vilão, mas o uso de preto em Ilsa tem outro significado, referente à sua falha em um serviço. No caso de Ilsa, o vestuário faz parte da ação, pois ela tira os sapatos de salto alto quando vai correr, dobra as mangas da camisa antes de lutar e veste um macacão de couro para pilotar uma motocicleta. Seu protagonismo simbólico é tamanho em determinada sequência que a escolha da cor citrino para seu vestido não poderia ser mais acertada, dando a ela o destaque necessário.
O desfecho dos antagonistas de “Nação secreta” é irônico no texto e especialmente inventivo ao usar a luz para ludibriar Lane. Trata-se de um filme com elementos técnicos de alto nível e de roteiro muito bem escrito, um blockbuster que servirá como norte para seus semelhantes.
Desde criança, era fascinado pela sétima arte e sonhava em ser escritor. Demorou, mas descobriu a possibilidade de unir o fascínio ao sonho.