“MISSÃO: IMPOSSÍVEL 3” – Pela retomada dos eixos
Para ler a crítica do primeiro filme (“Missão: impossível“, de 1996), clássico do mês de julho de 2018, clique aqui.
Para ler a crítica do segundo filme (“Missão: impossível 2“, de 2000), clique aqui.
Por vezes, um filme pode ter um valor maior dentro do projeto mais amplo do que como obra individual. MISSÃO: IMPOSSÍVEL 3 encarna com perfeição a frase anterior ao suceder “Missão: impossível 2” com o desafio de amenizar as decepções deixadas por seu antecessor: um filme brega, de escolhas duvidosas e incapaz de unir bem um grande diretor de ação com um astro hollywoodiano de apelo popular. Ainda que não seja o melhor título da franquia, o terceiro filme consegue recuperar alguns sentimentos positivos para aqueles personagens e para seu universo da espionagem.
Na aventura da vez, Ethan Hunt precisa voltar à ativa quando uma de suas pupilas, Lindsey, é sequestrada pelo negociante de armas Owen Davian. Ele tenta cumprir a missão, formando uma nova equipe, enquanto ainda busca preservar uma vida comum ao lado de sua futura esposa Julia. Diferentemente do longa anterior, essa narrativa é mais comedida nos excessos fantasiosos das sequências de ação e da própria história e prefere criar uma trama simples que potencialize a diversão. Há o espião que tenta largar a vida de riscos (e não consegue), uma suposta última missão que o devolve à ação, a dinâmica de elaboração de um plano pelos agentes, tecnologias mirabolantes (que se apresentam como possibilidades concretas) e reviravoltas na definição dos vilões – tais recursos são movidos por uma estrutura narrativa que envolve a resolução de um plano fracassado e um MacGuffin (elemento que simplesmente move o filme sem que jamais saibamos o que é).
O grande erro das escolhas do roteiro está na forma como tentam dar realismo ao protagonista e às suas interações. É uma intenção válida, porém executada com sobressaltos que, ao fim, não consegue ocultar suas deficiências. Por mais que não seja uma novidade, o arco do agente que se esforça para levar uma vida comum e vê seus entes queridos em perigo poderia render frutos através da personagem de Julia, interpretada por Michelle Monaghan. Entretanto, a condução desse elemento dramático se mostra interessante apenas no início e não se sustenta posteriormente: apesar de apresentar bem o conflito inicial vivido por Ethan de deixar um ambiente seguro e simples nas primeiras sequências, a pobre composição de Julia e os momentos inoportunos para se levantar a possibilidade de uma vida corriqueira (na execução do plano ou no meio da ação, por exemplo) enfraquecem a subtrama.
Interpretações esquecíveis parecem ser a tônica da maioria do elenco, não por culpa própria, mas por falta de material do roteiro. Lawrence Fishburne, Billy Crudup, Ving Rhames, Jonathan Rhys Meyers, Maggie Q e Simon Pegg cumprem apenas funções esquemáticas dentro das necessidades da história. O mesmo não vale para os dois principais atores do projeto: Tom Cruise novamente representa perfeitamente Ethan Hunt, entregando-se de corpo e alma ao personagem (provavelmente, o ator será mais lembrado em sua carreira pelo agente da IMF) em sequências de ação extremamente arriscadas, mas também na demonstração dramática do temor que sente por sua esposa; e Philip Seymour Hoffman constrói um vilão ameaçador através da figura imponente e do tom de voz frio que dificilmente se altera (e quando o faz, sentimos uma ameaça ainda maior) – ambos são favorecidos pela abordagem realista dada ao confronto entre eles, tanto pelo fato de não terem um antagonismo físico propriamente dito, quanto pela tensa abertura do filme.
O salto de qualidade em relação à produção anterior também está presente na trilha sonora e na paleta de cores. O compositor Michael Giacchino utiliza o clássico tema “Mission: impossible” nos momentos emblemáticos e dramaticamente relevantes da narrativa, além de dosar alguns acordes em outras ocasiões como forma de construção de uma ambientação própria. A conjunção do figurino, idealizado por Collen Atwood, e o design de produção, pensado por Scott Chambliss, estabelecem a saturação de cores quentes que criam uma beleza visual importante do ponto de vista estético.
Aproveitando-se da saturação da cores, o há época estreante cineasta J. J. Abrams constrói um estilo resultante da mistura entre série televisa e videoclipe. Em termos gerais, graves problemas aparecem: há um excesso de closes e planos americanos que pecam por não explorar os ambientes onde estão os personagens e onde se desenrolam as sequências de ação; e um constante movimento de tremor da câmera, mesmo durante diálogos ou momentos de maior calmaria, que passam uma sensação permanente de velocidade e urgência, muitas vezes incompatível com o que acontece em tela. O equívoco no uso da câmera enfraquece algumas sequências de ação justamente devido aos movimentos à exaustão feitos anteriormente (por exemplo, a perseguição de helicópteros no fim do primeiro ato), mas, no geral, o diretor entrega bons momentos de adrenalina em que é possível visualizar e compreender os acontecimentos.
“Missão: impossível 3” não está entre os melhores exemplares da franquia, nem é o pior. Ocupa uma posição mediana, justificada por seus acertos na singeleza da trama e no embate entre protagonista e vilão e seus defeitos no desenvolvimento de questões do roteiro e na estética impressa por J.J. Abrams. Ainda assim, seu maior mérito está em superar o longa anterior e mostrar como o projeto “Missão impossível” poderia continuar e evoluir.
Um resultado de todos os filmes que já viu.