“FEIOS” – Quando a perfeição mostra o vazio
A busca pela perfeição estética é um tema sempre relevante e, em FEIOS, essa questão ganha destaque em um futuro distópico onde todos passam por cirurgias estéticas aos 16 anos para se tornarem “perfeitos”. A ideia de que a beleza é a chave para uma vida ideal permeia o filme, colocando em evidência os efeitos da pressão social sobre a aparência e o vazio que a obsessão por padrões estéticos pode gerar. Nesse contexto, o longa explora as consequências da conformidade e da superficialidade de uma forma impactante, mas que, em alguns momentos, perde profundidade devido à sua execução apressada e excessivamente acelerada.
A trama acompanha Tally, uma jovem prestes a completar 16 anos, ansiosa pelo dia em que será transformada pela cirurgia e se tornará “bonita”. Ao seu lado, Shay, sua amiga rebelde, questiona essa sociedade superficial, rejeitando a cirurgia e preferindo buscar liberdade criativa e autenticidade verdadeira.
O filme dirigido por McG aborda diretamente a pressão social em torno da beleza, ressaltando como a cirurgia aos dezesseis anos é vendida como a solução para todos os problemas imagináveis. A promessa de que “tudo ficará bem” após se tornar bonito reflete uma crítica clara à cultura de filtros e padrões irreais que se vê nas redes sociais. Uma das metáforas mais eficazes do filme é o uso de um aplicativo que permite aos personagens visualizarem sua aparência “perfeita” antes da cirurgia, destacando a frustração que muitos sentem ao não conseguirem atingir na vida real o que veem nas telas de seus celulares. Em vez de apenas criticar os filtros como uma ferramenta de engano, o filme questiona a própria premissa de que a beleza externa pode garantir uma vida plena e significativa, refletindo sobre a superficialidade de uma cultura obcecada pela aparência.
A trama é apressada e, muitas vezes, superficial, o que prejudica o desenvolvimento das ideias centrais e dos personagens. Até mesmo o romance presente na história parece apressado e pouco explorado. Embora as mensagens sobre beleza e autenticidade sejam interessantes, a narrativa parece sacrificar a profundidade em favor de um ritmo acelerado e pouco envolvente. Isso afeta também a utilização do elenco. Vivendo Tally, Joey King entrega uma performance sólida e convincente, mas os demais atores, como Brianne Tju (Shay), Keith Powers (David) e Chase Stokes (Peris), têm atuações medianas, em grande parte devido ao roteiro que não lhes oferece material suficiente para brilhar. A dinâmica entre os personagens principais poderia ter sido mais rica e complexa, mas acaba se limitando a convenções narrativas previsíveis.
O filme utiliza contrastes visuais para destacar as diferenças entre os “bonitos” e os “feios”. Quando está no mundo dos bonitos, o cenário é sempre vibrante, cheio de cores vivas e luzes cintilantes, enquanto o lado dos feios e dos rebeldes da “Fumaça” é retratado com tons acinzentados e sombrios, sugerindo uma vida mais dura e menos idealizada. Esse uso das cores reforça a ideia de que, apesar de toda a ostentação e brilho, há uma superficialidade no mundo dos bonitos que não pode ser ignorada ou disfarçada. O design de produção e a trilha sonora reforçam a diferença entre os mundos dos bonitos e dos excluídos de maneira eficaz. A trilha musical é usada para acentuar esses contrastes, com músicas vibrantes e otimistas no mundo dos “bonitos”, que refletem a superficialidade e o brilho desse ambiente idealizado. Em contraste, o mundo dos “feios” é acompanhado por uma trilha mais sombria e melancólica.
A direção opta por cenas de ação e movimentos rápidos que acompanham as decisões impulsivas de Tally. Embora isso crie uma atmosfera de urgência, a execução visual, especialmente nas cenas de computação gráfica, é inconsistente e falha em manter o nível de imersão desejado.
No final das contas, “Feios” oferece uma reflexão relevante sobre os perigos de uma sociedade obcecada pela aparência, mas poderia ter explorado esses temas com mais profundidade e nuance. A crítica ao uso de filtros e ao culto à beleza é pertinente, mas a narrativa se perde em uma abordagem superficial que sacrifica o desenvolvimento dos personagens em favor de um ritmo acelerado e cenas de ação. Ainda assim, a mensagem central sobre o valor da autenticidade e da liberdade de escolha se mantém, deixando uma lição importante sobre os padrões irreais de beleza que moldam nossas vidas e a necessidade de desafiá-los.
* Crítica resultante de colaboração especial de Alysson Pagotto (@alyssonpagotto) para o Nosso Cinema.