“CREED II” – Encontre a resposta
*Para ler a crítica de “Creed: nascido para lutar“, de 2015, clique aqui.
Quando tocam as primeiras notas de “Eye of the tiger” (Survivor), CREED II chega a arrepiar. O momento, porém, é exceção em uma obra que é boa, mas que raramente chega a um nível excepcional – diversamente do que ocorre no primeiro filme, mais criativo e textualmente complexo.
No longa, Adonis consegue notável progresso na carreira, conquistando o respeito de todos e saindo da sombra do pai, Apollo Creed, bem como do seu treinador, Rocky Balboa. Seu próximo desafiante, todavia, é o filho do pugilista responsável por matar seu pai, o que torna a luta proposta muito mais pessoal do que as demais.
Depois de dirigir o primeiro filme, a ausência de Ryan Coogler na função era um receio óbvio, principalmente considerando que o seu substituto seria o inexperiente Steven Caple Jr., enquanto Coogler figuraria como um dos produtores executivos. Os defeitos do longa, entretanto, não decorrem da direção, que é boa. Caple Jr., com inteligência, repete muitos recursos usados por seu antecessor, o que não significa falta de originalidade, mas coerência entre os episódios. O prólogo é um pouco morno e a câmera na mão em planos estáticos não é bem usada, porém o rack focus é cirúrgico (na verdade, todo o trabalho de foco é elogiável), os spinning shots são também certeiros – recursos explorados no filme de 2015 – e o super slow motion aumenta o impacto dos golpes nas lutas, sem exagero em seu uso. Além disso, a imersão do espectador é inegável, pois as lutas parecem muito reais dentro da programação da HBO Sports.
A fotografia de Kramer Morgenthau não é, em regra, expressiva, salvo em momentos-chave. As entradas de Adonis nas lutas são fenomenais, com um show de luzes (inspirado nos eventos reais, onde realmente há um espetáculo antes das lutas, o que dá verossimilhança à película) e bom uso da trilha musical – o rap, contudo, foi subaproveitado na medida em que serve apenas como música de fundo. Ainda na fotografia, a contraposição entre Adonis e Viktor é eloquente: o vermelho que o primeiro usa na roupa representa a raiva, quando é o segundo, é uma relação com o país que está representando (o que serve como grande motivador ao ucraniano); quando os dois treinam, prevalece para Adonis uma paleta de cores quentes (basicamente, o amarelo), com exercícios praticados em um ambiente aberto e de clima árido, enquanto Viktor treina em um lugar fechado, com uma paleta de cores frias (principalmente o azul e o cinza).
Os nomes creditados como criadores da ideia original são Sascha Penn e Cheo Hodari Coker, porém é Sylvester Stallone quem assina a autoria do roteiro, enquanto que, no longa antecessor, os roteiristas são Coogler e Aaron Covington. Stallone não é exímio roteirista, escrevendo apenas nas áreas que conhece (filmes como “Rambo” e “Os mercenários”, além da própria franquia Rocky). No caso de “Creed II”, mesmo funcional, a narrativa é demasiadamente repetida, principalmente em relação ao quarto filme da franquia (em termos globais, isto é, considerando os filmes que tinham Rocky como protagonista). Além disso, comparando a “Creed: nascido para lutar”, o texto é bem mais singelo.
É importante observar que não apenas na direção a continuidade é observada: no script, a primeira conversa entre Adonis e Bianca é uma referência cômica em relação ao primeiro. Depois do primeiro ato, há uma maior independência narrativa, focando na relação entre pais e filhos e no orgulho ferido. No primeiro caso, trata-se não apenas do arco dramático de Rocky (em uma interpretação menos chamativa de Stallone, comparativamente ao filme anterior) mas também de conflitos internos do protagonista (papel que ratifica a enorme revelação que foi Michael B. Jordan, talvez até mais emocional que em 2015). Quanto ao orgulho, é uma batalha de egos entre Viktor (interpretado pelo ex-lutador Florian Munteanu), Ivan (papel revivido por Dolph Lundgren, que, apesar da experiência, é menos expressivo que Munteanu) e Adonis.
De certa forma, as figuras de antagonismo e vilania são distintas, o que dá maior dinamismo à trama. Ivan e Viktor se mesclam no polo antagonista, de modo que aquele é o cérebro e este são os músculos do oponente secundário de Adonis (o primário ele já conhece, só não percebe com facilidade, ao contrário do espectador – ao menos o que viu o longa antecedente). Não existe exatamente uma vilania ou sequer uma inimizade entre os soviéticos e Adonis; o próprio Rocky reconhece que a luta não é propriamente do jovem Creed. O que move os antagonistas é uma honra ofendida, o que justifica Ivan ter criado seu filho no ódio (repetindo novamente as palavras do Garanhão Italiano). O vilão é Buddy Marcelle (Russell Hornsby, em atuação suficiente), pois é quem fomenta a rivalidade, em especial através do marketing. Para uma dupla que desenvolve rancor, ter a raiva semeada por um terceiro gera uma explosão difícil de ser contida. Do outro lado, resta ao protagonista uma questão simples e complexa: por que (por quem, para quem) ele luta?
Depois de conquistar o topo, o que pode motivar Adonis, se quem nutre rancor é Viktor? Que medo Michael B. Jordan imprime em sua voz, qual o sofrimento que suas lágrimas expressam? O terceiro ato tem um empolgante tom épico, mas não dá uma resposta nítida. Cabe ao espectador a encontrar.
Desde criança, era fascinado pela sétima arte e sonhava em ser escritor. Demorou, mas descobriu a possibilidade de unir o fascínio ao sonho.