“BRIDGET JONES: LOUCA PELO GAROTO” – A loucura talvez não seja ruim
Diante do contexto em que se encontra a protagonista de BRIDGET JONES: LOUCA PELO GAROTO, é natural pensar que o “garoto” entregaria a ela novos problemas. Não é esse o caso: ele aparentemente não tem defeitos e faz a sua vida mais feliz (ao menos da maneira como o filme retrata, é claro). Não faz sentido, assim, a elaboração de duas partes díspares na narrativa em termos de tom. Talvez a loucura não seja tão ruim quanto parece.
Com o falecimento de Mark Darcy, seu marido, Bridget Jones precisa agora cuidar sozinha dos seus dois filhos, Billy e Mabel, ainda que conte com a ajuda de familiares e amigos, além do ex-amante, Daniel. Seu momento de vida exige mudanças, sendo uma delas um possível romance com Roxter, um rapaz bem mais novo que ela.
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Ainda que não tenha dirigido os filmes anteriores, Michael Morris consegue manter o elo de continuidade com eles, seja nos elementos formais, em especial o design de produção, seja no conteúdo, sobretudo nos Easter eggs que vão do primeiro filme, “O diário de Bridget Jones” (a citação a “All by myself”, a calcinha etc.), ao último, “O bebê de Bridget Jones” (nesse caso, trata-se da participação de Emma Thompson, cuja relevância é diminuta). Para o nicho de fãs da franquia, é certamente um deleite o reencontro de Bridget com os amigos e familiares vistos no longa de 2001, com destaque para Daniel, que Hugh Grant interpreta cada vez melhor. Depois de três filmes, Daniel parece ter crescido como personagem, deixando de ser um pervertido ofensivo para se tornar um amigo relativamente confiável e que, no fundo, é apenas um fanfarrão, no máximo, inconveniente.
No caso de Bridget, sua vida é um vaivém emocional que agora impõe o enfrentamento de novas dificuldades. Ignorando problemas como o rosto esticado de Renée Zellweger, provavelmente fruto de procedimentos estéticos que a impedem de demonstrar emoções por meio da face, assim como o incômodo VFX em seus lábios em uma sequência mais do que previsível, dessa vez a protagonista se depara com um conjunto de problemas novos. São eles: a solidão da viuvez, a dificuldade de criar duas crianças sozinha e uma lacuna existencial (em parte, resultante dos dois primeiros) sobre as próprias atividades desempenhadas (isto é, voltar ou não ao mercado de trabalho). Diante desse cenário, como sempre na vida de Bridget, todas as pessoas que lhe são queridas lhe dão conselhos, que, em sua maioria, reduzem a sua vida a uma relação afetivo-sexual. A propósito, a cena em subjetividade mental, na qual essas pessoas aparecem em sua casa, é de uma incoerência surpreendente: se são flashbacks, isso não fica claro; se são suposições, é um exercício hipotético de pensamento estúpido e desnecessário, inflando a obra (ainda que por um tempo muito breve).
Nesse sentido, “Louca pelo garoto” tem um ritmo cansativo e, para uma comédia romântica superficial, é demasiado longa. Morris não sabe dosar os gêneros: em uma cena, Bridget está se recordando dos últimos instantes com o pai; quase na cena seguinte, está dançando e pulando na cama com os filhos, impulsionados por uma música alegre. O drama do filme é extremamente frágil, principalmente a tristeza dos filhos pela ausência do pai, que é muito negligenciada. O roteiro de Helen Fielding, Dan Mazer e Abi Morgan funciona melhor na primeira parte, em que Roxter (Leo Woodall) traz os dois gêneros para o arco da heroína. Mesmo que a maioria das piadas seja ruim (as situacionais são óbvias, as verbais, sem graça), nessa parte a obra se assume como uma romcom despretensiosa que defenestra o sexismo e o etarismo. Mais do que isso, a objetificação ocorre com Roxter, enaltecendo seus predicados, dos quais Bridget faz proveito, reduzindo substancialmente a depreciação da protagonista, comum nos outros filmes. Essa é, provavelmente, a maior virtude do filme: não se levar a sério e permitir que Bridget descubra que uma vida hedonista pode suprir suas necessidades.
Na segunda parte, todavia, os roteiristas se recordam do luto por Mark e, para dar a carga dramática, tiram o boy toy Roxter de cena e colocam os holofotes em um intelectual, o senhor Walliker, interpretado por ator mais gabaritado, Chiwetel Ejiofor. Entretanto, o erro reside na transição nada sutil de uma para outra personagem secundária: quando o proeminente é Roxter, há romance e há comédia; quando o destaque está com Walliker, o longa assume uma entediante conspicuidade. Em outras palavras, Roxter não representa uma inovação, mas é minimamente divertido e foge um pouco do trivial, o oposto de Walliker. A “loucura”, ao final, é bem mais interessante que a “sanidade”.
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Desde criança, era fascinado pela sétima arte e sonhava em ser escritor. Demorou, mas descobriu a possibilidade de unir o fascínio ao sonho.