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“BLACK TEA – O AROMA DO AMOR” – O sabor delicado do chá e a tensão das diferenças

BLACK TEA – O AROMA DO AMOR é um drama ambicioso que explora a complexidade dos relacionamentos interculturais e os desafios que surgem no choque entre mundos distintos. Com uma premissa envolvente, o filme busca captar a luta por pertencimento e aceitação enquanto toca temas de amor, identidade e preconceito. No entanto, a narrativa fragmentada e os diálogos abruptos prejudicam a imersão, deixando o espectador com uma sensação de desconexão. A obra se propõe a ser tanto um romance quanto uma reflexão existencial, mas essa dualidade às vezes dilui a força dos temas principais, enfraquecendo a jornada emocional dos personagens.

Na trama, Aya, uma jovem africana, decide deixar o noivo no altar e abandonar sua vida na Costa do Marfim para começar de novo na China, onde passa a viver em uma zona marcada pela diáspora africana. Trabalhando em uma loja de exportação de chá, Aya conhece Cai, um chinês de 45 anos que leva uma vida pacata e contida. A atração entre os dois cresce em meio às diferenças culturais, e o casal tenta navegar entre os desafios e preconceitos que surgem de seu passado e de novo contexto. O filme explora se o amor entre Aya e Cai pode superar a turbulência de suas histórias e as barreiras culturais que os separam.

(© Imovision / Divulgação)

A direção de Abderrahmane Sissako traz uma perspectiva única para a trama, explorando o romance entre Aya e Cai com uma abordagem delicada e introspectiva. Os diálogos entre os protagonistas, no entanto, são frequentemente interrompidos de forma abrupta, o que prejudica a fluidez e a intensidade emocional. Nina Mélo, no papel de Aya, traz uma presença marcante, transmitindo a confusão e a esperança de sua personagem ao entrar nessa nova fase de vida. Seu parceiro de cena, Chang Han como Cai, apresenta uma atuação reservada, refletindo a contenção de alguém que viveu uma vida isolada e de aparência tranquila. Juntos, eles constroem uma relação que, apesar das dificuldades do roteiro, revela os dilemas e a força de um amor que desafia as normas culturais. Os personagens coadjuvantes também desempenham papéis importantes nesse contexto: Wu Ke-Xi, como Ying, e Michael Chang, como Li-Ben, acrescentam camadas de complexidade ao mostrar as diferenças culturais que separam Aya e Cai. Ainda assim, o roteiro não aprofunda suficientemente a interação deles com os protagonistas, tornando-os figuras de apoio sem grande relevância para o desenvolvimento da narrativa principal.

Em termos de estética, o diretor utiliza os cenários de forma simbólica, como a loja de chá, que representa um ponto de encontro entre culturas, bem como um refúgio para Aya e Cai. Contudo, o espaço ao redor dos personagens permanece desfocado, e a relação de Aya com o ambiente que a cerca acaba não sendo aprofundada. A cidade chinesa em que a história se desenrola poderia servir como uma extensão das emoções da protagonista, mas a falta de exploração do cenário deixa a experiência visual um pouco vaga, perdendo a oportunidade de utilizar o espaço como um elemento narrativo adicional. A trilha sonora, por outro lado, é um dos pontos altos da produção, adicionando uma atmosfera envolvente que intensifica os momentos de introspecção dos personagens e enriquece a experiência sensorial do filme.

Todavia, a inserção de delírios e fantasias de Aya e Cai em cenas-chave adiciona uma camada de confusão à narrativa. Embora esses momentos possam ser interpretados como uma tentativa de externalizar os anseios e os temores dos protagonistas, eles aparecem sem a devida contextualização. O ritmo irregular dessas cenas acaba prejudicando a continuidade da história, tornando a jornada emocional mais fragmentada. O roteiro de Kessen Tall, junto à direção de Abderrahmane Sissako, parece buscar uma fusão entre o realismo mágico e o drama romântico, mas o resultado é uma narrativa que se torna difícil de seguir em certos momentos. Esse esforço acaba dificultando a conexão do espectador com os personagens, afastando-os da profundidade emocional que a história poderia ter alcançado. 

“Black tea – o aroma do amor” é uma produção visualmente instigante, mas a execução deixa a desejar ao tentar capturar a intensidade de um romance intercultural. Mesmo com boas atuações de Nina Mélo e Chang Han, o filme não atinge todo o potencial emocional de sua premissa. Em suma, a obra representa um esforço interessante do diretor em abordar a diáspora e o amor, mas as lacunas no roteiro e a falta de coesão narrativa resultam em um filme que poderia ter sido mais impactante.