“AQUAMAN 2 – O REINO PERDIDO” – Triste fim de um universo em declínio
Não há nada em AQUAMAN 2 – O REINO PERDIDO capaz de surpreender o público. Ainda que nem todos os filmes precisem gerar surpresa, a falta de criatividade é gritante. Não obstante, o que compromete a produção é sua inabilidade em cativar o público, circunstância com a qual essa falta de criatividade colabora em alto grau.
Arthur Curry segue uma vida dupla como humano, cuidando de seu filho recém-nascido, e como rei de Atlântida, com as responsabilidades inerentes ao cargo. Diante da ameaça global representada pelo retorno de David Kane, que encontra uma arma que o torna mais poderoso do que nunca, o super-herói Aquaman precisa da ajuda de seu meio-irmão Orm para deter o vilão Arraia Negra.
Tudo começa com uma autoridade (protagonista) que, clandestinamente, liberta um criminoso para ajudá-lo na captura de um criminoso mais perigoso. Essa ideia vem, por exemplo, de “O silêncio dos inocentes”, ou, com tom humorístico, da comédia de ação “48 horas”. Em produção mais recente e mais similar, “Thor: o mundo sombrio” faz o mesmo: Thor liberta seu irmão Loki (citado, expressa e ironicamente, em “Aquaman 2”) para, juntos, derrotarem Malekith. No filme da Marvel, o vilão se aproveita de uma pesquisa científica, exatamente o que acontece no da DC.
O problema do filme dirigido por James Wan não é somente copiar boa parte do plot do segundo filme-solo do Deus do Trovão, mas o fato de constituir incontáveis repetições do que já foi feito, geralmente de filmes de fantasia (sci-fi e terror em especial). Assim, também o antagonista aceita uma troca de favores, porém com uma entidade sobrenatural (o que faz sentido, dada a filmografia de Wan), analogamente a “A múmia” e “O labirinto do fauno”. Como em “Donnie Darko”, há uma personagem influenciada e que tem visões, sofrendo por uma espécie de possessão demoníaca à “O exorcista” ou “A bruxa de Blair”. Quanto à pesquisa científica, surge um subplot de censura aos resultados ou mesmo arrependimento, no melhor estilo “Jurassic Park: o parque dos dinossauros” e “Frankenstein”.
Evidentemente, cada um desses filmes tem suas peculiaridades, capazes de torná-los especiais, quando não clássicos da sétima arte (salvo, é claro, o filme da Marvel). É justamente nisso que repousa o equívoco da produção da DC: não existem peculiaridades, ou ao menos novas peculiaridades capazes de expandir o universo já estabelecido em “Aquaman” (também dirigido por Wan). É inegável que há muitos filmes com possessão demoníaca, por exemplo, mas há características que tornam os bons representantes dessa categoria simplesmente inconfundíveis. “Aquaman 2” é genérico e recheado de clichês, característica que não se restringe ao roteiro escrito por David Leslie Johnson-McGoldrick (a partir da história desenvolvida por ele, Wan, Jason Momoa e Thomas Pa’a Sibbett) e alcança também aspectos visuais da película. Por exemplo, a cena na Cidadela Submersa é, graficamente, muito semelhante à que ocorre no planeta Tatooine em “Star Wars: episódio IV – uma nova esperança”.
Há uma diferença entre usar filmes anteriores como inspiração ou mesmo referência, de um lado, e simplesmente se aproveitar do que já foi feito antes, sem nenhuma dose de originalidade, de outro. A criatividade do design de produção de Bill Brzeski se esgotou no filme de 2018 do super-herói marinho: os melhores atributos de seu trabalho, dessa vez ao lado de Sahby Mehalla, são os mesmos do primeiro filme. Logo, há muito uso de cores fluorescentes, de modo que as fantásticas cores neon são belas e coerentes com a atmosfera, mas não impressionam, já que não são novas (o novo traje, apesar de novo, tampouco impressiona). As criaturas de Necron, assim como seu líder, são extraídas de “O Senhor dos Anéis: o retorno do Rei”; o diretor poderia ter abraçado sua veia voltada ao terror, sendo uma oportunidade perdida, principalmente porque seria um diferencial da obra. O CGI poderia dar mais detalhes de textura e o 3D é muito mal utilizado.
Não é apenas o lado pictórico do longa que deixa a desejar, uma vez que a trilha musical, além de nada marcante, é restrita a poucas músicas (uma delas, o enorme clichê cinematográfico “Born to be wild”), o que denota um trabalho preguiçoso de Rupert Gregson-Williams. Nada disso significa, entretanto, que “Aquaman 2 – o reino perdido” seja uma completa perda de tempo. Mesmo se considerando mais engraçado do que realmente é (a piada da barata é, no máximo, medíocre, a da garra, sem graça), o filme tem na interação entre Arthur (Momoa) e Orm (Patrick Wilson) bons momentos, funcionando sobretudo pelo contraste entre a ironia do primeiro e a seriedade do segundo (ressalte-se: outro clichê). Algumas cenas de ação são boas, mas sem grandes atrativos: para a fuga na floresta, a franquia “Jumanji” é mais interessante.
Diante de tamanha ausência de individualidade, o filme não se torna envolvente para a plateia. Nos bastidores, houve problemas, como a polêmica comprometendo Amber Heard (cuja participação, não à toa, é minúscula), e a mudança de rumo da DC, mas isso não justifica a baixa qualidade do resultado apresentado. É o triste fim de um universo de super-heróis cujo nível decaiu a cada produção.
Desde criança, era fascinado pela sétima arte e sonhava em ser escritor. Demorou, mas descobriu a possibilidade de unir o fascínio ao sonho.