“MOONFALL: AMEAÇA LUNAR” – Os Vingadores de Emmerich
Muito antes da Marvel Studios criar seu universo cinematográfico com inúmeros super-heróis, Roland Emmerich já havia (co)escrito e dirigido, em 1996, um clássico na seara do heroísmo: “Independence day”. De um lado estão os heróis fardados e dispostos a arriscar suas vidas (foi o caso da personagem de Will Smith), ajudados por heróis não fardados, mas igualmente dispostos (Jeff Goldblum); de outro, as pessoas comuns que precisam sobreviver (Bill Pullman), em especial os familiares dos heróis (Vivica A. Fox). Se a Marvel criou sua fórmula de sucesso, Emmerich fez o mesmo com filmes-catástrofe com um impulso similar (o do heroísmo), repetindo-a em MOONFALL: AMEAÇA LUNAR. A diferença é que o cineasta não compartilhou seu universo – ao menos ainda.
Por motivos desconhecidos, a Lua sai de sua órbita e vai colidir com a Terra em poucos dias. Ex-astronauta, a diretora Fowler assume a liderança da missão para evitar o evento. Na preparação, ela descobre que o único astronauta tecnicamente capaz de cumprir os objetivos é Brian, seu ex-colega de equipe que executou uma viagem especial em condições adversas similares, mas que entrou em descrédito após a mesma viagem. Enquanto isso, Brian aprende sobre a Lua com KC Houseman, um teórico conspiracionista que, para surpresa de todos, pode ter razão. Os três devem unir forças junto a outras pessoas dedicadas para evitar a destruição do planeta.
Roland Emmerich é um especialista nos filmes-catástrofe. “Independence Day” (1996), “Godzilla” (1998), “O dia depois de amanhã” (2004) e “2012” (2009) são algumas de suas obras focadas na luta da humanidade pela sobrevivência. Geralmente, tudo começa na realidade – no caso de “Moonfall”, com referências à Apollo 11, que não poderia ser deixada de fora -, porém a fuga ao real é elastecida na medida em que a trama se desenvolve. Não se pode dizer, contudo, que o longa engana o espectador: em mais de uma oportunidade é declarada a inaplicabilidade das leis da física, isto é, que boa parte do conhecimento científico que se tinha estava equivocado. É assim que são justificados terremotos, erupções vulcânicas, enchentes etc. A partir dessa colossal suspensão da descrença, o texto faz viagens maiores que uma espacial, passeando por inteligência artificial, alienígenas, código da vida e assim por diante.
“Moonfall” pode ser adjetivado de diversas maneiras – em especial, ambicioso e grandiloquente, talvez mais que seus antecessores da filmografia de Emmerich -, mas não é desonesto com o espectador, já que apresenta as próprias premissas de maneira clara, tampouco incoerente, pois se mantém fiel a elas. Em princípio, dada a animosidade entre Fowler e Brian, não faria sentido que ela o chamasse, todavia o script deixa claro que ela o chama porque ele é o mais qualificado, dadas as circunstâncias. É verdade que o roteiro de Emmerich (coescrito também por Harald Kloser e Spenser Cohen) tem seus equívocos (um detonador quebrado que volta a funcionar aqui, uma lacuna sobre a relação entre os dois ex-colegas ali), mas isso parece fazer parte da proposta. Há diálogos pavorosos (a artificialidade da conversa entre Tom, Brenda e Brian sobre ajudar Sonny, por exemplo) e pequenas contradições (por que a personagem de Donald Sutherland revela os segredos com tanta facilidade?); nada que prejudique a experiência, contudo.
Afinal, ninguém vai assistir a “Ameaça lunar” esperando um roteiro primoroso. A primeira cena, por exemplo, é muito boa: ao som de “Africa” (Toto), a calmaria espacial cede espaço ao caos do inesperado, uma cena parecida com o incidente incitante de “Gravidade” (ainda que tecnicamente inferior na fotografia), inclusive no uso do reflexo no capacete como ferramenta de suspense. As cenas de ação também estão lá, como a perseguição na Terra protagonizada por Sonny (Charlie Plummer, que só não é pior que Eme Ikwuakor, intérprete de Doug) regada a um show piromaníaco de tiros que não acertam seu alvo e veículos que deslizam na neve e saltam entre superfícies, sem jamais capotar.
Um problema no desenvolvimento do longa acaba sendo a divisão em dois arcos, um com os heróis, outro com os familiares. Mesmo que Halle Berry e Patrick Wilson não empolguem nos papéis de, respectivamente, Fowler e Brian, seu parceiro John Bradley torna KC bastante carismático (além disso, essa é a trindade dos heróis!). Histriônico (como ao falar com as crianças) e infantil (como ao tirar selfies em momentos inapropriados), KC é uma personagem farsesca que combina com a proposta surreal do longa, destoando, desse modo, dos exageradamente sérios colegas de heroísmo. O filme não é sério. Ao lado de Plummer, na Terra, estão um discreto Michael Peña (sem o humor que o tornou famoso), uma apática Wenwen Yu e outros irrelevantes em meio a um pânico da população que não é suficientemente explorado.
Visualmente, “Moonfall” fica mais interessante quando os astronautas executam sua missão, momento em que o roteiro também toma maiores liberdades. A trilha musical de Harald Kloser e Thomas Wanker, no melhor estilo Hans Zimmer, transmite sons metálicos gélidos a um local fascinante (o espaço), prejudicando um pouco a experiência. A questão é que assistir a este filme significa se desprender da lógica e aproveitar a luta contra a extinção da humanidade enquanto acompanha heróis praticando atos de heroísmo, algo que, nessa ótica, não é muito diferente de “Os Vingadores”. O que os distancia consideravelmente é a preocupação com as pessoas comuns, que têm muito menos espaço que os super-heróis, mas não tão menos quanto os heróis.
Desde criança, era fascinado pela sétima arte e sonhava em ser escritor. Demorou, mas descobriu a possibilidade de unir o fascínio ao sonho.