“NOSSO ÚLTIMO VERÃO” – De uma pobreza visual e temática
As comédias teen tentam agradar seu público-alvo com cenas amorosas de personagens bonitos e carismáticos. Quando elas não possuem um algo a mais e se restringem apenas a uma sucessão de belas pessoas em situações românticas, a narrativa se sabota e as potencialidades visuais do cinema são simplesmente ignoradas. Esse é o caso de NOSSO ÚLTIMO VERÃO, nova produção original Netflix, que falha absolutamente em tudo que tenta, desde as convenções do gênero até o estilo cinematográfico.
O filme durante muito tempo se configura como um conjunto de esquetes pouco articuladas entre si que acompanha o último verão de alguns jovens antes de entrarem na universidade. O período de férias é o que separa os amigos de diferentes caminhos que estão prestes a trilhar após suas escolhas educacionais e profissionais. Enquanto o momento para essas importantes decisões não chega, os personagens ocupam seu tempo livre com trabalhos temporários, relacionamentos familiares e românticos ou sonhos há muito desejados.
Enquanto os personagens são apresentados, uma narração em voice over anuncia o que pode ser o tema principal: como jovens em vias de deixar o Ensino Médio podem aproveitar suas férias e também projetar as possibilidades de um futuro que se abre em termos de educação, formação pessoal e amor. O que aparentemente seria trabalhado logo é abandonado pelo roteiro, interessado apenas em mostrar momentos comuns, genéricos e artificiais em que homens e mulheres namoram, terminam relacionamentos, cogitam as universidades onde estudarão e se desentendem com os pais. O material é tão pobre que os atores, mesmo carismáticos, não salvam diálogos esquemáticos sobre namoro à distância, quebra de confiança e brigas formulaicas.
Boa parte dos prejuízos causados ao desenvolvimento do tema se deve também à montagem, que imprime à narrativa um caráter novelesco da pior espécie. Os muitos personagens são divididos em núcleos muito díspares em relação à importância dramática e ao tempo de tela, cabendo ao casal formado por Phoebe e Griffin um destaque maior e aos demais jovens breves aparições em arcos sintéticos. O ritmo, portanto, segue a batida de uma novela ou de um filme ruim feito especificamente para televisão, em virtude dos vários cortes rápidos e das cenas que duram poucos segundos – condições assim transformam muitos momentos em segmentos pouco relevantes ou pretextos para aumentar a duração da obra. Além disso, os saltos de um núcleo a outro ou passagens dentro deles mesmos são incompreensíveis, carecendo de uma ligação dramática ou de uma relação de causa e efeito.
O casal protagonista é aquele que possui algum arco mais facilmente reconhecível, ainda que o fato não seja uma qualidade. A interação entre os dois personagens leva mais tempo do que o necessário para embalar, devido aos problemas da montagem, e, quando enfim acontece, não consegue ser diferente do clichê da jovem que aceita ter um compromisso apesar do discurso inicial de dar atenção apenas ao filme que está fazendo. O convívio entre eles rende alguns momentos genéricos sobre um casal se apaixonando (como a declaração de amor vinda de repente e a montagem em paralelo de seus encontros) e o completo desconhecimento de como inserir um conflito em seus arcos – o conflito somente surge dentro de uma daquelas coincidências dignas de novelas preguiçosas e se desenvolve de maneira absolutamente previsível.
Esse núcleo também revela deficiências graves da direção. As escolhas estéticas simples para a composição dos planos não são, necessariamente, um problema sério (mesmo que o excesso de planos médio e americano e da filmagem dos diálogos enquadrando os personagens no mesmo plano se torne repetitiva e enfadonha), mas quando o cineasta tenta algo expressivo falha consideravelmente: os slow motions responsáveis por criar momentos vergonhosos (como a simulação de um duelo de faroeste envolvendo sacolas de comida ao invés de armas) e o uso redundante da trilha sonora para informar sem sutilezas a emoção que o público deveria sentir.
Enquanto Phoebe e Griffin não estão em cena, os demais jovens dão vida a fiapos de subtramas, porque seus “arcos e conflitos” não são identificados rapidamente nem possuem algum nível de construção narrativa razoável. Existem aqueles que terminaram o namoro e tentam seguir suas vidas separados; um que criou uma lista de avaliação da beleza das mulheres e se comporta como um machista; uma babá que se conforma com o pouco que a vida lhe dá; e dois amigos nerds que querem desfrutar os prazeres da vida antes de começarem a universidade. Nesses núcleos, as falhas de construção e encadeamento das cenas são muito visíveis e responsáveis por prejudicar suas resoluções, que chegam apenas em instantes esquemáticos e diálogos expositivos e inverossímeis; e a fotografia abusa tanto de um tipo de luz artificial típica de estúdios televisivos de baixo orçamento que as sequências não são iluminadas com um tom realista nem com algum sentido dramático.
“Nosso último verão” nem sequer poupa seu torturado público, já sofrido com tantos problemas narrativos e estéticos, com uma duração enxuta. São quase duas horas de clichês mal usados, falta de conhecimento para tratar os personagens e suas trajetórias e amadorismo para trabalhar a linguagem cinematográfica que tornam a tarefa de encontrar alguma virtude uma proeza hercúlea. Ao final, o próprio cinema é uma vítima de algo como essa nova produção Netflix.
Um resultado de todos os filmes que já viu.