“VINGADORES: ULTIMATO” – Uma conclusão digna
* Clique aqui para ler a crítica de “Os Vingadores”, de 2012.
* Clique aqui para ler a crítica de “Vingadores: era de Ultron”, de 2015.
* Clique aqui para ler a crítica de “Vingadores: Guerra Infinita”, de 2018.
** A seguinte crítica NÃO contém spoilers de “Vingadores: ultimato”. Contudo, eventuais informações sobre o enredo, periféricas ou vagas, podem ser fornecidas no texto – nada que prejudique a experiência do leitor. Não obstante, caso o objetivo seja não saber absolutamente nada sobre a trama do longa, talvez seja melhor postergar a leitura para depois de assistir ao filme.
Mesmo analisando de maneira fria o Universo Cinematográfico Marvel (MCU), não há dúvida que o trabalho conduzido pelo produtor Kevin Feige desde “Homem de Ferro”, de 2008, culminou em um projeto ambicioso cujo ápice é uma ode aos fãs. Ambicioso, porque não há precedentes, na história do cinema, de um compartilhamento narrativo de tantas histórias conexas – são vinte e dois filmes durante onze anos. Encarado como um todo, não há blockbuster tão grandioso, do ponto de vista quantitativo. Para encerrar a “Saga do infinito”, VINGADORES: ULTIMATO é uma conclusão digna dessa grandiosidade e, principalmente, da paixão que o MCU fomentou no público. Admirações à parte, como filme, o epílogo desse conjunto é bom, mas não seu auge qualitativo.
Em “Ultimato”, depois do estalar de dedos de Thanos em “Vingadores: Guerra Infinita”, os heróis estão desiludidos e frágeis emocionalmente. Tony Stark vaga no espaço perdido e na companhia apenas de Nebulosa; na Terra, Steve e Natasha lideram os remanescentes que planejam contornar os atos do vilão, sem saber ao menos se isso seria possível.
O roteiro de Christopher Markus e Stephen McFeely não é de uma linearidade óbvia: mesmo começando em um momento coerente com o fim de “Guerra Infinita”, além de injetar drama logo no prólogo, a cronologia é pulverizada e flerta com o bagunçado diante de tantos elementos conectados. Com narrativas paralelas no segundo ato, o que prevalece são conjecturas e muitos diálogos, surpreendendo um pouco por não ter tanta ação quanto se poderia esperar. A despeito das três horas de duração, esse tempo não é preenchido com pirotecnia e exibicionismo de CGI, mas executado para ter lógica ao encadeamento narrativo da trama (o que, sem dúvida, é positivo). O filme não é cansativo em razão da expectativa para o ato final, porém o desenvolvimento poderia ser mais enxuto.
Embora não haja exagero na ação, é evidente que os diretores Joe e Anthony Russo se esbaldam nela, quando necessário. Com sabedoria, não ignoram a necessidade de drama, afinal um acervo tão robusto (vinte e dois longas) precisa emocionar ao final (para a parcela mais emotiva da plateia, lágrimas podem se tornar inevitáveis), sobretudo considerando o vínculo afetivo entre os espectadores e os heróis. A comédia também está fortemente presente, o que é marca do MCU e talvez tenha sido fator decisivo para tamanho sucesso de público. O humor é mais concentrado em algumas personagens específicas, nem sempre sendo funcional (por exemplo, é melhor no visual do Thor do que com a piada do traseiro).
Os irmãos Russo criam uma atmosfera mais sombria e depressiva do que nos filmes anteriores, mesmo comparando com “Guerra Infinita”. Isso também é resultado do estado de espírito das personagens principais, como um Steve Rogers mais raivoso do que de costume (o que se reflete no palavreado, uma sutileza sagaz do texto) e um Tony Stark derrotista. Chris Evans e Robert Downey Jr. tiveram em “Ultimato” seus melhores trabalhos em razão dos densos conflitos criados para as personagens: “Cap” mantém o inconformismo, mas se vê diante de um beco sem saída, ganhando nova energia ao vislumbrar uma possível saída; Tony fica literalmente dividido entre o certo e o duvidoso.
Várias personagens antigas retornam, destacando-se, ainda entre os Vingadores “originais”, a Viúva Negra vivida por Scarlett Johansson e o Bruce Banner de Mark Ruffalo. Natasha exibe um visual de transição, traduzindo imageticamente seu momento fronteiriço, distante do perfil assertivo que ela costumava ter, além disso, Johansson vai muito bem nos momentos dramáticos da personagem, que foram crescendo no MCU. Hulk também tem um perfil renovado, compartilhando o protagonismo em uma cena que surpreende. Aliás, a despeito de eventuais obviedades e previsibilidades, o roteiro consegue surpreender em diversos aspectos. Um deles é a maior importância dada à outrora vilã Nebulosa, interpretada por uma ótima Karen Gillan. Em razão de uma ambiguidade criada pelo roteiro, a filha de Thanos se torna engrenagem narrativa fundamental – o mesmo pode ser dito do Homem-Formiga de Paul Rudd, que não se reduz a alívio cômico, tampouco ao gancho óbvio criado em “Homem-Formiga e a Vespa” (cuja crítica pode ser lida clicando aqui).
Há momentos de puro fan service, como a luta entre o Capitão e Thanos, além de uma poluição visual no clímax (sem olvidar o cuidado dos diretores em delimitar o espaço de todos), resultado óbvio da grandiloquência da produção. Há também personagens cuja importância é episódica – é o caso da festejada Capitã Marvel (a crítica do filme solo pode ser lida clicando aqui), cuja personalidade, bem interpretada por Brie Larson, destoa dos demais pela prepotência e pelo simplismo (o que agrada somente aos fãs).
Percebe-se que a película conta com erros e acertos, logo não se trata do melhor filme da história, muito menos do pior. No primeiro caso, o trabalho de maquiagem (especialmente em Tony e Steve), o uso da música-tema e, claro, os efeitos digitais magníficos. No segundo, algumas pontas soltas, deus ex machina (a cena do rato é forçada demais) e um relativo vazio simbólico (a mensagem, além de piegas, é de menor relevância). Ou seja, o roteiro é o calcanhar de aquiles, mesmo não sendo ruim. De todo modo, o que “Vingadores: ultimato” consegue é o que todos os filmes buscam, mas nem todos obtêm êxito: emocionar o espectador. O desfecho é digno do projeto.
Desde criança, era fascinado pela sétima arte e sonhava em ser escritor. Demorou, mas descobriu a possibilidade de unir o fascínio ao sonho.