“O MACACO” – Inexorabilidade da morte, versão adolescente
Uma das lições mais básicas aprendidas por qualquer pessoa, ainda na infância, é que absolutamente tudo tem um fim, inclusive a vida de um ser. As incertezas da existência são inúmeras, mas a morte é a única certeza inafastável. Não é possível evitar que um ser vivo morra, pois isso é inerente à própria vida, isto é, quando se vive, em algum momento, a morte vai ocorrer. É com esse ar pedagógico que O MACACO aborda a sua ideia governante, segundo a qual, repetidas vezes, esclarece ao espectador que a morte é inevitável.
Bill e Hal são irmãos gêmeos que não poderiam ser mais diferentes em suas personalidades. Certo dia, eles encontram um macaco de brinquedo de seu pai, e, a partir desse momento, as pessoas ao seu redor passaram a morrer em acidentes terríveis. Diante disso, eles jogam o brinquedo fora e, na idade adulta, se afastam, circunstâncias que não acabam sendo definitivas.

Com a produção de James Wan – diretor responsável por nada menos que “Jogos mortais”, dentre outros filmes de terror – e baseado em um conto de Stephen King, o diretor e roteirista Osgood Perkins possivelmente acreditava estar coberto por um manto de qualidade, dispensando uma elaboração refinada para um longa. Tratando-se, porém, de um conto, a chance de a trama carecer de enriquecimento não é pequena, sob pena de ficar superficial, o que de fato acaba ocorrendo.
A filmografia de Perkins é voltada aos gêneros terror, horror e thriller, tendo o cineasta alcançado o seu auge com “Longlegs – vínculo mortal” (imerecidamente, pois o longa é decepcionante). Com “O macaco”, a mola propulsora para o horror é um brinquedo, tal qual slashers como o clássico “Brinquedo assassino” e o recente “Ursinho Pooh: sangue e mel”. Aqui, porém, o brinquedo não suja as mãos para matar, o que concede muito mais potencial à narrativa, na medida em que fornece ferramentas para mortes acidentais criativas – o que realmente ocorre. Há uma dose generosa de exagero no sangue e na bizarrice das mortes, o que é pensado para ser interessante porque elas ocorrem como acidentes. Os eventos fatais são esquisitos, estupidamente improváveis e muitas vezes engenhosos, mas sempre acidentais.
Com base nisso, o roteiro de Perkins dá um passo além em relação à inexorabilidade da morte (seu tema nuclear) para indicar que a existência em si é um acidente, porém a abordagem das ideias é extremamente rasa. Quanto à primeira, o didatismo é escandaloso, com frases explicativas reiteradas e cansativas vezes. Quanto à segunda, existe apenas um diálogo, entre Hal e Pete, com uma camada dramática além do óbvio. Ocorre que, ao final, quando um protótipo de mistério envolvendo o vilão é revelado, o texto se torna contraditório, pois as mortes não eram naturais, inevitáveis, nem acidentais – afinal, o macaco é quem as provoca (ainda que aleatoriamente), sendo ele provocado por uma pessoa. Especificamente sobre o vilão, sua motivação é frágil, pois ele instrumentaliza o macaco mesmo sabendo que não vai atingir o seu objetivo (além disso, sua devoção ao brinquedo é caricata). O roteiro conta ainda com um subtexto sobre paternidade, que, todavia, não é aprofundado ou mesmo problematizado. Por exemplo, a ausência da figura paterna poderia explicar o comportamento de Bill e Ricky, mas não explica por que Hal é diferente.
Não se trata de um filme desprezível, como se denota do design de produção, mesclando o contemporâneo (fones bluetooth) com o vintage (a arquitetura das casas, a lista telefônica…), e da montagem, cujas elipses são muito bem construídas. Visualmente, o macaco é muito bem feito, com suas rugas acima do nariz, os olhos e o colete avermelhados e o leve sorriso macabro que se alarga quando funciona – provavelmente, é o que o filme tem de melhor. Diante de suas limitações como ator (considerando o que apresentou previamente), Theo James se esforça para diferenciar Hal e Bill através da voz, não muito mais do que isso. No elenco estão ainda Tatiana Maslany, Elijah Wood e Adam Scott, todos em participações brevíssimas.
No primeiro ato do filme, suas personagens principais (Hal e Bill) são adolescentes; depois, um deles continua sendo deveras imaturo, surgindo ainda outro adolescente. Essa adolescência não é gratuita, pois se reflete na obviedade e na agravante do didatismo, antes mencionadas, sugerindo que Perkins subestima o espectador. Porém, não é esse o caso, dado o humor pueril – e geralmente muito ruim – atribuído à obra: o discurso do padre, o tio se apresentando, a excentricidade de Ted e Barbara, a mão estendida nos minutos finais etc. Ou seja, “O macaco” tem virtudes estéticas, mas, no fundo, é apenas um horror juvenil acerca do ensinamento humano mais básico que existe.


Desde criança, era fascinado pela sétima arte e sonhava em ser escritor. Demorou, mas descobriu a possibilidade de unir o fascínio ao sonho.