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“LOBISOMEM” (2025) – Por que um lobisomem?

A mitologia envolvendo o ser humano que se transforma em metade lobo – o lobisomem – é muito rica e bastante plural. Com origens que remontam à Grécia Antiga, as mais diversas regiões do mundo estabeleceram lendas a seu respeito, com as respectivas regras próprias: morre apenas com bala de prata, quem se transforma é o primeiro filho homem de um casal que teve sete filhas, se transforma apenas na lua cheia e assim por diante. Em LOBISOMEM, de 2025, não há a construção de mundo, o que torna a obra simplória. Esse, porém, não é o seu maior equívoco.

Com a morte de seu pai, Blake retorna ao Oregon com Charlotte, sua esposa, e Ginger, sua filha, para recolher objetos pessoais de seu genitor na casa onde residia. Chegando no local, a família é atormentada e aterrorizada por uma assustadora e perigosa criatura – um lobisomem – que coloca em risco a vida dos três.

(© Universal Pictures / Divulgação)

O roteiro escrito por Corbett Tuck junto do também diretor Leigh Whannell é completamente despido de criatividade em termos narrativos e paupérrimo do ponto de vista de worldbuilding e concepção de personagens, o que afeta a proposta temática. Em que pese ao fato de ser um filme de terror e ter todas as convenções do gênero, não é um terror estático, mas, ao revés, com muita ação. O que se torna problemático, inicialmente, é o modo como a ação é conduzida, na medida em que, logo após o incidente incitante, a família ingressa em uma espiral repetitiva de fuga e retorno ao abrigo que é, no mínimo, cansativa (inclusive minando, em parte, a adrenalina). Os cenários são singelos; as situações, clichês. Como se fosse um terror dos anos 1980, as personagens são estúpidas e os eventos de roteiro, previsíveis.

O texto tampouco constrói uma mitologia própria sobre o lobisomem. Parte disso se deve ao fato de que há poucas personagens – sendo elas alienadas quanto ao ser que enfrentam – e poderia funcionar como fator surpresa, todavia, a ausência de explicações revela que não houve preocupação alguma em estabelecer uma mitologia para a criatura. Como surgiu o (primeiro) lobisomem naquela localidade? Em que condições ele se transforma? Existe cura? Como é possível matá-lo? Evidentemente, o filme não precisaria entregar todas as respostas para tais questionamentos, mas seria muito mais sólido se fornecesse algumas respostas.

Família é o tema do filme, o que é costurado a partir das personagens. Entretanto, elas são muito mal desenvolvidas. Christopher Abbott se empenha como Blake, mas o papel é restrito ao pai muito ligado à filha e com uma aparente crise no casamento, algo muito pedestre. Ainda mais insosso é o papel de Julia Garner, uma vez que Charlotte não tem personalidade alguma, é como se fosse uma folha em branco. Quanto a Ginger, mesmo considerando a pouca idade de Matilda Firth, a busca de casting deve ter sido difícil para encontrarem uma criança tão inexpressiva quanto ela (que não é capaz sequer de chorar). Como o incidente incitante ocorre cedo e, a partir dali, a ação prepondera, o discurso sobre o tema é oco. Os minutos iniciais demonstram uma conexão firme entre pai e filha, mas Charlotte é marginalizada pelo roteiro, o que é incompreensível quando se considera que ela precisa ter relevância.

Chama a atenção o fato de que a explicação de como um homem se torna lobisomem está presente (uma das poucas), mas isso não permite inferir o porquê simbólico da transformação. Em outras palavras, não se justifica por que aquelas pessoas específicas mereciam se deparar com a criatura, isto é, o que isso modificaria em suas vidas, representando uma evolução ou uma penalidade. A resposta dada pelo roteiro é “porque sim”, o que revela que não se cogitou ampliar o significado do lobisomem para além de um monstro apavorante.

Ainda pior do que não pensar no lobisomem, como dito, para além de um monstro apavorante – o que reforça a inabilidade de desenvolvimento do tema familiar -, ele não é realmente apavorante. Novamente como nos filmes de terror mais antigos, as cenas são filmadas com pouca luz e diminuta visibilidade, escondendo a maquiagem mal feita, que é exposta realmente (no claro) em apenas uma cena. Whannell tenta fazer algo diferente ao elaborar o ponto de vista do lobisomem, fazendo movimentos de câmera e colocando efeitos visuais e sonoros (de estética ruim, inclusive), mas isso, a rigor, não diz nada sobre o lobisomem, apenas que ele tem um ponto de vista diferente (por exemplo, não consegue se comunicar pela fala).

A convergência de todos esses fatores leva a uma conclusão inevitável: o filme desejou apenas fazer um filme em que uma família é assombrada por uma criatura da qual seus integrantes tentam fugir o tempo todo. Não há uma articulação entre o lobisomem e o tema familiar, salvo em uma descoberta óbvia e que acaba sendo indiferente. Aliás, a criatura poderia ser um vampiro, por exemplo, sem nenhum prejuízo. Logo, não houve uma reflexão na escolha, ela foi feita somente para justificar a ação, o que escancara, pois, a má qualidade da obra desde a sua concepção.