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“SEBASTIAN” – A luta interna entre ser e esconder

SEBASTIAN mergulha na complexidade das identidades duplas e nos conflitos internos que emergem quando os limites entre realidade e ficção começam a se dissolver. A trama ousa explorar o desconforto e a vergonha, tanto do protagonista quanto de seus diferentes “eus”, enquanto enfrenta os desafios de sustentar uma narrativa tão íntima e emocionalmente carregada. Apesar de um início promissor e momentos de boa execução, o filme tropeça em clichês narrativos e em sua cadência, comprometendo parte de seu impacto emocional.

Max, um jovem escritor em busca de material para seu primeiro romance, decide se aventurar como acompanhante sexual sob o pseudônimo de Sebastian. Ao atender seus clientes, ele se depara com um mundo de desejos e fantasias que desafiam suas próprias convicções e o forçam a enfrentar medos profundos sobre si mesmo. Essa experiência começa a moldar não apenas sua percepção de identidade, mas também as relações com aqueles ao seu redor. Sua convivência com Nicholas, um escritor experiente que atua como mentor, e Amna, sua amiga de longa data, revela diferentes facetas de sua luta interna, enquanto a fronteira entre o trabalho como acompanhante e sua vida pessoal se torna cada vez mais nebulosa.

(© Imovision / Divulgação)

Dirigido e roteirizado por Mikko Mäkelä, o filme constrói, em sua primeira metade, uma narrativa envolvente e introspectiva, que se destaca pela forma como explora a complexidade das emoções do personagem central. A atuação de Ruaridh Mollica, que dá vida a Max, é cheia de nuances e sutilezas, capturando com sensibilidade os conflitos internos enquanto ele tenta equilibrar suas duas identidades. O diretor imprime uma vulnerabilidade autêntica ao ator, tornando palpável o peso emocional das escolhas e o desconforto de enfrentar suas próprias contradições. Ele não apenas sente vergonha de Sebastian, mas também da vergonha de ser quem é e do desejo de ocultar partes de si mesmo, criando uma dinâmica rica e emocionalmente carregada. Essa abordagem cuidadosa e detalhada dá força à trama, permitindo que o espectador mergulhe mais profundamente nas dualidades e nos dilemas existenciais do personagem

Porém, o longa enfrenta dificuldades em sustentar completamente sua proposta. O ritmo irregular, com momentos que se arrastam, dilui o impacto de cenas que poderiam ser mais marcantes. Isso é especialmente evidente na relação de Max com Nicholas, um escritor mais velho interpretado por Jonathan Hyde. Embora as interações entre eles sejam recheadas de diálogos reflexivos, a falta de química e intensidade entre os atores prejudica a credibilidade dessa relação, que carece do peso emocional e da profundidade esperados.

Por outro lado, a relação do personagem com Amna, vivida por Hiftu Quasem, funciona como um contraponto mais sólido à turbulência emocional que ele enfrenta. Sua presença traz uma perspectiva diferente e um toque de humanidade, ajudando a ancorar a narrativa em algo mais tangível. Além disso, o trabalho de direção se destaca pela atenção aos detalhes visuais, especialmente nas escolhas de iluminação e enquadramento, que ressaltam a claustrofobia emocional vivida pelo protagonista enquanto tenta equilibrar suas duas identidades.

O arco final, no entanto, sofre com um desenvolvimento apressado, comprometendo o impacto da conclusão. Embora alguns momentos significativos ao longo da narrativa apontem para a aceitação de Max, essa transformação acaba parecendo repentina e mal fundamentada, como se a história tivesse saltado etapas essenciais para consolidar o peso emocional dessa jornada. A conclusão carece de nuances e não entrega o impacto esperado, deixando uma sensação de que o filme evitou explorar camadas mais profundas de seu protagonista e da trama.

No geral, “Sebastian” é uma obra que impressiona por sua ousadia temática e por momentos de brilhantismo na direção e atuação, mas que tropeça em sua execução narrativa. Mikko Mäkelä demonstra sensibilidade ao abordar questões de identidade e vergonha, mas o longa não consegue manter a intensidade emocional e a coesão necessárias para atingir todo o seu potencial. Ainda assim, é uma experiência válida para aqueles que buscam uma obra introspectiva e disposta a desafiar convenções, mesmo que falhe em explorar todas as possibilidades que propõe.