Nosso Cinema

A melhor fonte de críticas de cinema

“HOLY COW” – Envolvente [48 MICSP]

A aparência de HOLY COW é a de um coming of age comum. Certamente o longa se filia ao subgênero, porém a medida em que conduz o seu drama o torna diferenciado. Sem recorrer ao melodrama nem simplificar o ponto de partida da narrativa, trata-se de um filme, acima de tudo, envolvente.

Em uma cidade no interior da França, o jovem Totone gasta seu tempo bebendo cerveja e indo a festas. Sua vida sem responsabilidades muda completamente quando, do dia para a noite, ele é obrigado a cuidar de Claire, sua irmã de sete anos, e garantir o sustento de ambos. A solução que surge é ganhar um prêmio em dinheiro fazendo o melhor queijo comté da região.

(© Kino Lorber / Divulgação)

Trata-se do primeiro trabalho de Louise Courvoisier na direção de um longa, cujo roteiro foi coescrito por ela e Théo Abadie. “Holy cow” tem uma direção naturalista, incluindo até mesmo uma cena de um parto de um bezerro para irradiar a atmosfera bucólica. O grande mérito de Courvoisier, inclusive, é justamente a criação desse clima campestre, como pela fotografia, com planos abertos expondo a natureza, e pelo design de produção, com cores vibrantes (vermelho, azul e verde em especial). Para transmitir o intenso calor da região, a cor vermelha tem forte presença (além do vestuário, aparece no trator, no sofá etc.).

Em que pese ao fato de ter muitos dos vícios dos filmes coming of age, tais como o humor episódico (muitas vezes aliado ao carisma de Luna Garrett no papel de Claire) e a trajetória razoavelmente previsível, não são adotados os moldes hollywoodianos dotados de candura. Por exemplo, o sexo não é uma descoberta por si só e não é retratado como se espera, mas como uma novidade convincente. Além disso, há um subtexto importante na relação de Totone com o pai: ainda que ele não deseje verbalizar o assunto sequer com seu melhor amigo, esse tema é abordado de maneira não verbal. Assim, há uma proporção inversa entre o seu senso de responsabilidade e o consumo de álcool, bem como o amadurecimento e a assunção dos bens do genitor (um deles em especial).

Clément Faveau faz um ótimo trabalho para traduzir esse caminhar de Totone, que, mais do que aprender que precisa ser responsável, aceita as tarefas da vida adulta que se impôs a ele. É interessante perceber também que há uma personagem que impulsiona o amadurecimento de Totone. A despeito de sua juventude, Maïwène Barthelemy convence como uma moça a quem também se impôs a vida adulta, tornando-se um norte para o protagonista. Narrativamente, “Holy cow” não possui maiores diferenciais, mas tem um enredo com o qual é fácil se engajar e um protagonista carismático graças à sua dedicação e sua empolgação na empreitada enfrentada.

* Filme assistido durante a cobertura da 48ª edição da Mostra Internacional de Cinema em São Paulo (São Paulo Int’l Film Festival).