“TUDO QUE QUERO” – Feel good movie mais feel good do que movie
Com uma estrela como protagonista, uma história focada em uma personagem carismática com um objetivo admirável e contando até mesmo um simpático cachorro como coadjuvante, TUDO QUE QUERO é um feel good movie que é mais “feel good” do que “movie”.
Na trama, Wendy é uma inteligente garota autista que decide participar de uma competição de roteiros para “Star Trek”. Terminado o texto e sem tempo para enviá-lo pelo correio, ela decide levar seu script à Paramount mesmo sem a ajuda dos outros, contando apenas com a companhia de Pete, seu cachorro, e com o pouco dinheiro que conseguiu juntar.
O filme pode ser enxergado, do ponto de vista temático, a partir de duas perspectivas bem salientes. Na primeira ótica, mais branda, Wendy ensina que todas as pessoas devem ir atrás de seus sonhos, pouco importando as dificuldades a serem enfrentadas. Para ela, três segundos olhando nos olhos de uma pessoa conhecida é uma dificuldade, o que justifica a sua falta de senso de perigo ao dormir em uma sarjeta e entrar em um edifício desconhecido para se esconder. Também é possível enxergar “Tudo que quero” como uma metáfora da condição humana de busca pela independência. Isso fica bastante claro em uma conversa que Wendy tem com uma idosa, que explica que não quer ser um fardo para ninguém, o que visivelmente faz a garota refletir. É uma camada além da primeira: não apenas a concretização de um sonho deve ser a busca de todos, como também ninguém deve depender dos outros para alcançar os próprios objetivos.
O universo ficcional de “Star Trek” tem vital importância no plot: do ponto de vista narrativo, porque explica como ela consegue algum dinheiro sem depender de ninguém; do ponto de vista da construção da personagem, é evidente que ela se identifica com Spock. Sua cuidadora, Scottie, vivida pela ótima Toni Collette, não é capaz de entender o que em “Star Wars” (sic: para ela, não há distinção) exerce o fascínio na menina. É onde entra seu filho para, didaticamente, traçar um paralelo entre a situação de Spock e a da Wendy: ele é alienígena e tem dificuldades com emoções humanas, justamente como ela se sente. O vulcano (gentílico referente a quem vem de Vulcano, como é o caso de Spock) a representa na ficção, ou, mais precisamente, na ficção dentro da ficção. É perdida a chance de aprofundar o relacionamento entre Scottie e Sam (seu filho), de modo que ele se reduz a “traduzir” uma mitologia desconhecida para a mãe. A relação do longa com a fantasia está presente em uma das personagens: Audrey, irmã de Wendy, é interpretada por Alice Eve (apagada no papel pela falta de texto para a personagem), que, ironicamente, participou de “Além da escuridão – Star Trek”, ou seja, sempre que ela está em cena, é fácil recordar-se do filme.
Na pele da protagonista, Dakota Fanning faz o que pode para levar a singela produção nas costas. A atriz está muito bem interpretando uma autista, criando maneirismos, como o jeito de andar e as falas dirigidas a si mesma – incluindo “please stand by” (“por favor, contenha-se”), que é o nome original da película, quase um mantra que ela repete em uma cena -, atentando para retrair a voz e, principalmente, com um irrepreensível direcionamento do olhar (constantemente mirando baixo, com “olhadelas” episódicas para cima). O momento “freak out” da personagem está em uma cena que é impactante graças ao trabalho da atriz. Sabendo que o filme é da sua estrela, o diretor Ben Lewin faz de tudo para privilegiá-la, como na proximidade da câmera enquanto Wendy anda, no uso constante de planos mais fechados, aproximando-a do público (inclusive no primeiríssimo plano do prólogo), e na ausência de maquiagem para torná-la vulnerável, na mesma medida em que o figurino denota a sua energia pelo uso de cores vibrantes.
“Tudo que quero” tem o erro grave do uso de deus ex machina no terceiro ato, não conseguindo, além disso, explorar seus coadjuvantes, fazendo com que os subplots sugeridos sejam lançados em vão no enredo unidimensional. Vale muito mais pela interpretação de Fanning (que chega a se comunicar em klingon!) do que por outros atributos, derretendo corações frágeis pelo encanto do cachorro Pete, mas não pelas emoções autênticas que o filme poderia despertar enquanto tal.
Desde criança, era fascinado pela sétima arte e sonhava em ser escritor. Demorou, mas descobriu a possibilidade de unir o fascínio ao sonho.