“A COLMEIA” – O minimalismo que não entrega nada
Quando pensamos em uma história que se passa no interior e que trata de lavoura no cinema brasileiro, pensamos em filmes como “Abril Despedaçado” “Vidas Secas” e “O Pagador de Promessas”, filmes que retratam não só as dificuldades desse lugar como exploram calorosamente os dramas desses personagens de maneira extremamente expressiva e intensa e assim retratam essencialmente as dores do brasileiro. Já A COLMEIA é um filme levado ao extremo oposto, geograficamente por se passar no Rio Grande do Sul, em sua representação por demonstrar os problemas enfrentados por imigrantes alemães e por fim em sua representação imagética e dramática, por usar de uma agonia crescente e não evidenciada para retratar aquele espaço prisional em que o filme se passa. O problema é que toda essa frieza tecnicista acaba por imprimir também apatia por tudo que ocorre no longa.
A história acompanha um grupo de imigrantes alemães que vive em uma região remota do Sul do Brasil tentando se manter através da vida na lavoura, enquanto temem qualquer contato com estranhos locais, ao mesmo tempo em que tentam esconder a sua origem. Tudo isso vai gerando conflitos internos entre o grupo que parece que está ao ponto de se autodestruir a todo momento.
Os temas podem vir a ser interessantes quando se colocados em evidência, afinal o tema dos imigrantes alemães refugiados da Segunda Guerra Mundial que vieram para a América do Sul não foi nada explorado pelo cinema brasileiro, porém as escolhas de roteiro de Gilson Vargas, que também é o diretor do filme, são de ter esses elementos ignorados para abordar o clima de insegurança e inquietude daqueles que estão em um lugar em que não queriam estar. Então o diretor explora muito mais as relações entre os que moram na casa e a conexão com aquele simulacro que nunca é expandido. Propositalmente, o filme sustenta uma atmosfera opressora e de tensão que cerca aqueles personagens, a casa é um reduto e prisão, a floresta que os cerca os protege de serem atacados – ou apenas não deixa em vista os possíveis predadores desse grupo fugitivo?
As propostas do diretor na hora de abordar a atmosfera desse universo criado são o foco em uma fotografia fria que só tem algum aspecto de saturação no verde morto da mata e nas chamas fortes que os aquecem em momento de festejo, tentando ignorar as dores de tentar sobreviver quase sem recurso nenhum; em conjunto de uma direção de atores minimalista, com vozes baixas e poucas expressões. O problema é que isso, junto de um conjunto de não acontecimentos, torna o filme de uma hora e quarenta minutos extremamente cansativo e chato. Não são dados elementos suficientes para a conexão com os personagens, nem seus dramas ou suas rotinas têm elementos suficientes para tornar aquilo interessante, claro que pode ser justificado que a ideia era justamente colocar o tédio como um elemento que expressa o quão desconfortável é viver ali, porém o desconforto sublime não é desconforto, é tedioso, faltam então elementos que tornem a rotina mais tortuosa. O filme em certo momento passa inclusive por uma longa sequência de dez minutos em que todos os membros da casa precisam raspar os cabelos, como algum tipo de jornada de martírio torturante, mas que não transmite dor. Em sua frieza tecnicista só vem à mente o poder da forma vulgar como a novela “Laços de Família” usa a cena de corte de cabelo para expressar, em uma incrível e estática montagem, todo o processo de deterioração psicológica que a personagem está passando no seu tratamento contra o câncer. A direção da novela permite toda essa catarse e inclusive deixa que a própria personagem reaja e reflita sobre o resultado desse corte, o próprio tato em sua cabeça intensifica a reação ao encontrar um vazio que representa a fragilidade em que se encontra. O exemplo aqui está pra exprimir como essa pureza técnica impede o filme de em algum momento ganhar qualquer tipo de sensibilidade no sentido da expressividade humana. Podem até haver gritos e lágrimas em algum momento do longa, mas já era sem tempo, a intensidade necessária nunca é alcançada e esse possível cataclisma do grupo acontece, mas não é sentido. Então de que vale a beleza dos créditos surgindo nas águas do isolamento?
Sempre teimando em colocar em palavras, tudo aquilo que só é possível sentir.