“ARREMESSANDO ALTO” – Um comercial contra o basquete e a favor da NBA
As histórias de ascensão, principalmente daqueles que vieram de um lugar humilde, sempre atraíram o público, afinal, o cinema sendo o Teatro das Massas, ganhou forças ao colocar na tela um reflexo de quem lhes assistia. Por isso a força do personagem mais conhecido de Charles Chaplin, “O vagabundo“, que ironicamente estava em seus filmes sempre à procura de um trabalho. A ideia de trazer astros do esporte, dos palcos e até mesmo CEOs à frente das telas é uma maneira não só de humanizar e ao mesmo tempo mistificar mais ainda essas figuras, como também uma forma de colocar essa possibilidade de subir a escada do “sucesso” na cabeça daqueles que assistem, fazendo-os também acreditar na justiça que os levou até aquele momento. Pode então uma história como a de ARREMESSANDO ALTO nos iludir novamente, ao mesmo tempo em que não para de propagandear a NBA e como tudo aquilo é sobre ter poder financeiro?
Stanley, depois de anos trabalhando como olheiro para o time 76ers, está cansado, quer realizar seu sonho de ser técnico e aproveitar mais o tempo com sua família, pois as viagens no trabalho apenas o afastam de sua mulher e filha. Em meio a uma de suas viagens, encontra Bo Cruz, um espanhol que nunca jogou profissionalmente e que o olheiro acredita merecer chegar à NBA.
A montagem inicial tem força, vemos Stanley, interpretado por Adam Sandler, em sua jornada de viagens, as decepções e o cansaço de toda aquela posição em que está, com rápidos cortes intercalados de escalas, o que nos coloca na posição do protagonista. Porém, mais do que isso, vemos um homem que parece não acreditar em si mesmo, o que fica claro em um debate sobre que atleta escolher para colocar no time, entre a diretoria e aqueles que participam da parte prática de um time de basquete. Encontrar Bo Cruz surge então como essa oportunidade de sair daquela posição, de se provar, e também é o combustível que move o personagem para frente. Então Stanley, que sacrificou suas mãos para salvar um amigo atleta, perdendo sua chance nessa carreira, agora arrisca novamente o que tinha por alguém. Esse alguém é a pessoa que precisava daquilo que todos nós podemos precisar, pessoas por nós.
Bo Cruz não é necessariamente o personagem mais profundo do mundo, não é por ele que estamos acompanhando essa história. A narrativa não é necessariamente sobre o nascimento do grande astro, mas sim sobre aqueles que estão nas suas sombras. Mesmo assim, o personagem tem elementos interessantes que por fim o fazem perceber em uma bela cena, em que finalmente toda sua dor toma forma em lágrimas, ao lado de sua mãe, que coloca em palavras tudo aquilo reprimido em seu coração Stanley estava fazendo por ele o que ele fez por aqueles que amava, não pensar em si mesmo.
A complexidade das relações familiares dos dois personagens sofre junto de suas jornadas de crescimento por um grande problema: a forma como o diretor Jeremiah Zagar prefere perder tempo transformando o filme em um grande comercial de como a NBA é difícil de entrar, como ela é a única liga existente de basquete e em como é legal colocar estrelas do passado e do presente do basquete em cena, simplesmente porque eles querem isso. Se o filme era pra ser uma homenagem à liga, então que se entregasse de vez a isso. Todo o conjunto de grandes atletas em cena são easter eggs para que os aficionados pela tão valorosa liga fiquem emocionados com suas participações especiais. O filme se esforça tanto para criar esse sentimento em torno de como a NBA é o único caminho para o jogador de basquete que em determinado momento da trama, quando Bo acredita não mais poder fazer parte da liga, a possibilidade de ser jogador de basquete profissional deixa de existir. É como se o filme dissesse que o esporte só existe profissionalmente em um único país, em uma única liga e pronto, fora daquele espaço para eles deve existir somente quadras nas ruas.
Para além disso, o foco em construir essa jornada inspirada em “Rocky: O lutador” faz com que o filme sofra em outro elemento: a construção que nos prepara para as grandes cenas de basquete não passa de uma constante burocracia que levará um dos personagens para a NBA, é como se o esporte de verdade não importasse. Tudo que há de potencialmente empolgante em relação ao esporte parece ser a possibilidade de ganhar o que se deseja em cima dele, o dinheiro. Por isso o personagem do Stanley tem em suas falas o número de vagas na NBA e o piso salarial de 900 mil dólares em seu discurso.
Por fim, o filme não parece ter a força de colocar em imagens a beleza daquele esporte através das mãos da direção, é preciso então em seus créditos trazer a força do basquete, e como isso é feito? Isso mesmo, trazendo para a tela grandes momentos da história da NBA. Não negando o potencial dos momentos, que são maravilhosos, mas se é necessário ficar de lado para mostrar a beleza do basquete, então de que serve a linguagem cinematográfica?
Sempre teimando em colocar em palavras, tudo aquilo que só é possível sentir.