“6 BALÕES” – Quero ser indie (desesperadamente)
O cinema indie norte-americano já produziu olhares renovados sobre a arte de contar histórias, priorizando o naturalismo das relações humanas e uma estética simples voltada para os personagens. O problema começou a surgir quando os filmes independentes praticamente se tornaram um gênero e uma caricatura das novas abordagens escolhidas; a partir desse momento, clichês muito próprios apareceram nesse processo. 6 BALÕES sofre desse mal de querer adotar uma estética indie a qualquer custo e acaba comprometendo nossa ligação com a história e com os personagens.
O filme conta a história do esforço de Katie em ajudar seu irmão Seth enquanto ele sofria uma recaída com a heroína e ainda precisava cuidar da filha dele. A diretora Marja-Lewis Ryan abusa de movimentos de câmera não tradicionais para nos aproximar daqueles indivíduos: closes, câmera na mão, planos detalhes em objetos cotidianos, contre-plongées sutis, planos com os personagens confinados no canto do quadro, câmeras presas a objetos em movimento e num ângulo incomum (principalmente carros) e enquadramentos poucos convencionais dos personagens (por trás, especialmente). Tais opções estéticas são problemáticas porque não criam uma identidade visual para a narrativa, simplesmente despejam diversas técnicas a esmo, desprovidas de uma função dramática. Além disso, a mise en scène sofre com uma considerável poluição visual, algo tão prejudicial que dificulta ao público compreender o que acontece em diversos momentos (por exemplo, numa sequência em que Seth tem uma convulsão no interior do carro, a cineasta utiliza tantos efeitos e movimentos de câmera que nos distanciamos das sensações esperadas para uma situação dessas).
Outras questões técnicas de montagem e fotografia também se revelam defeituosas. Vários planos e sequências são entrelaçados sem cuidado, apenas saltando entre eles sem algum tipo de transição elegante ou sentido dramático mais expressivo. Dentro desse aspecto, ainda há inserções na narrativa, em sua maioria inexplicáveis, de algumas mensagens motivacionais por parte dos pensamentos de Katie; reflexões de autoajuda a respeito de um barco aparecem desconectadas dos acontecimentos exibidos e só apresentam algum significado nos últimos minutos da projeção – provoca-se, assim, uma frustração por só conseguirmos ter elementos para entender esse recurso tardiamente. Já a fotografia exagera nos filtros de luz de tons azuis ou amarelos para criar uma sensação de naturalismo dos cenários, uma opção utilizada sem critérios que soa forçada e feia esteticamente.
Se ao menos o roteiro conseguisse desenvolver as possibilidades de sua história, as deficiências estilísticas poderiam passar desapercebidas. Porém, isso não acontece. O filme tenta construir sensações de familiaridade entre os personagens e um aspecto de cotidianidade nas suas relações que jamais se efetivam plenamente; em função da combinação problemática entre diálogos rasos que se pretendem coloquiais e um elenco coadjuvante apagado, não conseguimos acreditar que aquelas pessoas se encontrem diariamente e possuam algum tipo de laço emocional. “6 Balões” ainda consegue testar a paciência dos espectadores ao levantar diversos pontos que são difíceis de conceber: como seria possível acreditar em Katie, em dado momento, quando afirma que a festa surpresa para seu namorado, naquele dia, seria mais importante do que ajudar seu irmão? Como a criança poderia ser levada junto com o pai e a tia para os lugares mais perigosos e para as situações mais degradantes, sem que os adultos percebessem o erro cometido?
Em relação às jornadas de Katie e Seth, Abbi Jacobson e Dave Franco têm dificuldades para dar conta das variações de sentimentos existentes na trama. A atriz, involuntariamente, cria uma personagem antipática e de difícil identificação pelo público, já que é uma pessoa cabeça dura que tenta impor suas vontade a todo momento; possíveis nuances em sua personalidade não são bem trabalhadas por Jacobson, pois seus momentos de alegria são mal aproveitados e seus conflitos internos com o irmão são despejados na narrativa sem preparação ou construção dramática. Já Franco é um pouco mais eficiente em compor uma dimensão de seu personagem: o afeto e o carinho com que trata e brinca com sua filha (momentos de maior alívio para o tom geral da produção). Entretanto, ele tem poucos recursos para criar uma pessoa vítima do vício em drogas (por vezes, parece mais alguém saído de uma ressaca pontual provocada por uma noite de consumo exagerado de álcool).
Para não parecer que a obra só possui problemas, é possível citar duas pequenas virtudes: a maneira como Katie trata a dependência química do irmão, agindo de maneira nada ortodoxa e surpreendente para as expectativas tradicionais do público; além da existência de um conflito entre irmãos que remonta a mágoas e ressentimentos passados vivenciados por eles de modo diferente. Pena que essas virtudes não sejam desenvolvidas a contento, devido ao pouco tempo de tela ou ao seu precário desenvolvimento ao longo dos três atos.
Histórias sobre drogas são fortes pela forma como impactam a todos que as assistem. Porém, não seria necessário fazer uma estética indie tão acentuada para embalar essa trama. “6 Balões“, portanto, é um drama que tem o que dizer, uma temática com potencialidades. Só não é um filme que saiba como dizê-lo. E esse desconhecimento o atrapalha.
Um resultado de todos os filmes que já viu.