“4L” – Nem Jean Reno salva
Mesmo não sendo ofensivo ao público, 4L é um filme tão despido de virtudes que não alcança sequer o nível medíocre da maioria dos feel good movies. Não, o longa espanhol não é ao menos medíocre, é inferior.
Na trama, os amigos de longa data Tocho e Jean Pierre decidem ir da Espanha a Mali de carro, através do deserto, para reencontrar o terceiro do grupo, Joseba, que está muito doente. Para surpreendê-lo, vão com Ely, a filha de Joseba que ele não vê há dez anos.
A questão central do plot é o deserto, pois é um feel good movie travestido de road movie. Tratando-se de um cenário inóspito, o aspecto positivo é que a fotografia escura dos minutos iniciais adquire coesão com a aridez do local. Porém, o aspecto negativo é que, no geral, os conflitos enfrentados pelos três são externos a eles – são os que qualquer pessoa poderia enfrentar naquelas condições.
O roteiro de Gerardo Olivares, Maria Jesus Petrement e Chema Rodríguez se torna um descalabro não ao criar conflitos – são simplistas, mas verossímeis -, mas ao solucioná-los. Em resumo, tudo é dissolvido através de deus ex machina, que, como se sabe, é uma das ferramentas mais preguiçosas em qualquer narrativa. Se o problema que surge é plausível, a saída é quase um insulto à inteligência do espectador.
Tratando-se, por outro lado, de uma comédia, talvez o trio de roteiristas tenha pensado que havia maior liberdade para desatar os nós através do improvável. Essa hipótese, todavia, se mostra equivocada na medida em que o humor é paupérrimo e existem outros problemas de roteiro. Por exemplo, ao final, a narrativa desemboca em uma temática espinhosa, da qual foge covardemente, sem apresentar uma visão muito clara a seu respeito.
É triste que Jean Reno participe de uma produção tão apagada. Seu Jean Pierre representa uma enorme lacuna em relação ao backstory, ocorrendo o mesmo com Tocho (Hovik Keuchkerian). Este, além de lacunoso, é contraditório – basta ver a maneira como trata Ely (Susana Abaitua). O elenco todo vai mal, resultado inafastável de um script mal escrito, em que ninguém sabe quem realmente são aquelas pessoas. Não há nada além de flashes de suas vidas, que não explicam suas personalidades – ao menos não o suficiente para tornar suas atitudes coerentes.
Sem roteiro, Gerardo Olivares não tinha muito material para a direção. Há algumas tentativas de enriquecer o longa, como a simulação de filmagem caseira (diversas vezes, contudo, esquecida) e uma trilha musical que dialoga bem com as cenas, mas é pouco para dar brilho à película. Nos minutos iniciais, quando elementos imagéticos do campo apresentam os créditos, a aparência é de um trabalho razoável.
A própria sinopse pode ser promissora: um filme que trata sobre família e amizade. No primeiro caso, há um enorme vazio; no segundo, os laços afetivos são criados artificialmente, quando não incoerentemente. O previsível carinho do trio não é construído de maneira orgânica; o que ocorre é que, entre tapas e beijos, eles se unem diante das adversidades. É verdade que há uma surpresa no ato final, mas é apenas uma cena para destoar de todas as demais, sem verdadeiramente agregar ao filme.
Ao menos nessa ótica “4L” é coerente. Afinal, não faria sentido usar a palavra “agregar” em relação a algo que não tem nada a oferecer. Nem o carisma de Jean Reno salva o filme da catástrofe que é seu resultado.
Desde criança, era fascinado pela sétima arte e sonhava em ser escritor. Demorou, mas descobriu a possibilidade de unir o fascínio ao sonho.